sábado, 24 de dezembro de 2016

DESIDERATO AO ANO VINDOURO

    Hoje são 27 de dezembro, 361º dia do ano. Restam-nos 4 dias para o encerramento deste que será lembrado por muitos acontecimentos importantes ou não, desde roubos de fios de semáforos, aumento de violência contra grupos LGBTQAI+, surto psicodélico de golpistas trajados de cristãos e nacionalistas, após a vitória da DEMOCRACIA sobre a estupidez instigada por um falso presidente, eleito após a encenação de uma falsa facada, uma autêntica fakada; até a conquista de forma inédita do campeonato mundial de futebol pela Argentina, e consequentemente a consagração de Leonel Messi. Não necessariamente nessa ordem.





Hoje acordei com uma enorme vontade de desejar feliz natal a todos os amigos, inimigos, parentes, aderentes! Pensei num monte de frases bacanas, daquelas que engrandecem o âmago e massageiam o ego, daquelas que elevam a autoestima e nos fazem acreditar que tudo é possível.
Desejar um feliz natal, com muita paz, segurança, sem ódios, sem rancores; um natal em que todos possamos sorrir com sinceridade, abraçar sem falsidade, beijar sem permissividade.
Desejar um ano feliz, sem problemas, sem constrangimentos, sem dúvidas; um ano de bons sucessos, sem barreiras que impeçam a luz divina de adentrar todos os caminhos; um ano novo sem migalhas, sem aflições, sem dívidas e sem dores.
Enfim, um natal e um ano novo diferentes, repletos de alegrias e felicidades...
Mas não posso! As pessoas estão empedernidas, transformaram em pedra o barro de que foram feitas. Barro esse que só amolece diante de uma grande tragédia, ou quando se aproxima a morte de mais um ano. Logo depois se tornam o animal de que estão vestidos. A ganância pelo poder, ainda que pobre, mesquinho, lhes domina o ano e lhes emporcalha o ânus; as fezes da hipocrisia lhes embotam as faces, e rubores de medo obnubilam os desesperos; o perdão desaparece de seus olhos e só a intriga lhes rega o sangue.  Por isso saem durante o próximo ano atropelando-se e atropelando; desistindo do que se propuseram e xingando os dias que não passam, porque só passando as esperanças perdidas se nutrem, para pedir um ano melhor.
Por isso é ao ano que chega,  tataraneto de outros que se foram cabisbaixos, xingados e humilhados, cujas mortes desde cedo, pelos homens que não chegaram, foram sugeridas e carregaram consigo o enorme peso da inépcia humana...  É a esse bebê, que nascerá daqui a alguns dias, a quem desidero que a luz divina realmente caia sobre todas as pessoas e que elas possam se esforçar para conseguir seus intentos; que o sol, o qual brilhará no primeiro dia dessa criança, brilhe nos ombros e clareie a face da humanidade para que o ódio se desvaneça, que os egos cedam ao império da bom senso. Quero desejar ao ano vindouro que as pessoas, sendo mais de Deus e menos do mal, sejam corretas nas suas atitudes, pois só assim  quererão que o tempo passe devagarinho, ficando, para que as rosas tenham seu tempo, que as frutas amadureçam, que a chuva caia, sem ser amaldiçoada, que o sol encandeça, sem ser molestado por palavras vãs. Quero desejar ao ano nascente toda felicidade do mundo, que possa nascer, crescer e findar, sorridente, sem as úlceras dolorosas que a maldição das pessoas provocou aos seus antecessores.
(Professor Alves Andrade)

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

VIVOS E MORTOS





Hoje é o dia dos mortos
Dos mortos rezarem pelos vivos
Vivos de cá
Mortos de lá
Mortos de cá
Vivos de lá
Hoje é o dia dos mortos
Que encherão as ruas
Engarrafarão as vias
Vivos já mortos
Sem rumo, sem direção
Apegados aos seus alfarrábios
Apegados às suas crenças
Mesmo que não creiam
São as cinzas do tempo
O mofo da tradição
Vão eles compungidos
The Walking deads
Caras de ressaca
Uma flor na mão
Um salmo na boca
Um perjúrio na mente

E os verdadeiros vivos
Por pena (ou gratidão?)
Saem de suas atuais moradas
Para visitar no cemitério
Os realmente mortos!
(Professor Alves, 2/11/16)

domingo, 2 de outubro de 2016

SUICÍDIOS E ASSASSINATOS DE SONHOS


Todos os anos morrem no estado do Ceará cerca de 600 pessoas vítimas de suicídio, segundo dados do Jornal O Estado, de 5 de setembro deste ano. E na maioria dos casos as pessoas que tiram a própria vida são jovens. Esses números elevam nosso estado ao terceiro lugar no ranking do país. Em contrapartida, o número de assassinatos de jovens e adolescentes eleva o estado do Ceará ao primeiro lugar do país. Mas o que me trouxe às teclas foi a preocupação com outro tipo de suicídio e de assassinato: a destruição do que deveria ter sido e não é; e do que deveria ser e não foi.
                Explico. Imaginemos que o nosso estado possui uma quantidade muito grande de sonhos destruídos pela infeliz falta de coragem e/ou falta de empenho dos pais para que pudessem ser concretizados.  Os shoppings estão repletos de jovens trabalhando em lojas, lanchonetes; as ruas estão cheias de jovens carregando carrinhos de reciclagens; os sinais abarrotados de jovens vendedores de água, laranja ou coisa que o valha. Todos mortos! Um funeral de sonhos imensurável! Quantos médicos, engenheiros, juízes, jornalistas, inventores que deveriam ser e não foram. Mortos todos ainda na juventude, pela falta de empenho individual, ou pela falta de empenho dos pais. Quantos pais colocam seus filhos em grandes escolas, com mensalidades exorbitantes, certos de que a escola irá transformá-los em grandes homens e grandes mulheres. Como estão enganados. Quem transforma os filhos em engenheiros, advogados, jornalistas, escritores, inventores não são as escolas, mas os pais, com sua doação, dia após dia, incomodando e incomodados.
Aí quando chegamos à escola pública, os suicídios e assassinatos se multiplicam, pela lerda ilusão de que a escola é responsável pelos filhos. Não, a escola é responsável por desenvolver projetos pedagógicos. Quem transforma os sonhos dos filhos em realidade é a família. Quando perguntamos aos garotinhos e às garotinhas o que vão ser quando crescerem, ouvimos palavras bonitas projetadas em sonhos profissionais, todos imbuídos no desejo de crescerem e verem seus castelos grandes e fortes, sonhos realizados, mudando a família, a comunidade, a sociedade. Aí eles crescem e não dão em nada. Praticaram o suicídio do que deveriam ser, e para auxiliá-los contaram, na maioria esmagadora dos casos com o concurso dos pais e/ou dos responsáveis, homicidas de destinos!
Certa vez vi uma criança deixar uma repórter da Tevê Verdes Mares muda. A mesma fazia uma matéria sobre uma escolinha de futebol numa comunidade. O garotinho, bom de bola, foi interrogado pela repórter sobre o que queria ser quando crescesse. A repórter esperava que o garotinho dissesse que queria ser jogador de futebol, mas o mesmo respondeu-lhe peremptório: “médico”. A moça ficou sem saber o que dizer e encerou a matéria. Será que esse garoto, dentre tantos que querem ser jogador, que sonhava ser médico realizou seu sonho e se transformou em um grande doutor? Essa resposta não tenho. Mas tenho a certeza de que, como ele, muitos outros sonham com o jaleco branco e o estetoscópio, ou com a régua do engenheiro, ou com os papeis da jurisprudência, ou com o microfone da repórter.
E onde vão para todos esses profissionais? No cemitério, na vala comum dos sonhos destruídos suicidados ou assassinados. Na lápide de cada um está escrito: “aqui jaz doutor fulano de tal, morto aos 13 anos e substituído por um funcionário no balcão da exploração trabalhista, ou pela calçada da comunidade onde foi criado, latente em memórias úmidas descansando em um copo de cachaça”.
O grande estudioso do destino dos jovens brasileiros, Darcy Ribeiro, disse certa vez que a crise da educação brasileira não é uma crise, mas um projeto. Tudo muito bem urdido pelas elites e pelos governos, de esquerda ou de direita. Tudo muito bem planejado para manter a elite no poder e os pobres cada vez mais pobres, submissos aos salários irrisórios que são pagos, para que se paguem contas e nunca se abandone o destino que lhes foi traçado nas maternidades das periferias. É o eterno retorno contínuo. Filho de pedreiro pedreiro deverá ser; filho de arquiteto, sê-lo-á sempre. É que me lembrei de um episódio interessante. Enquanto aqui no Ceará, na construção do Castelão, em 1971, um filho trabalhava com o pai, este pedreiro, aquele, servente, e quarenta anos depois a mesma história se repetia; o pai pedreiro, e a filha, também. Em Belo horizonte, na reconstrução do Mineirão para a copa de 2014, um arquiteto trabalhava com o pai, que em 1971, na construção do mesmo estádio, era um dos engenheiros. Coincidência? Duvido. Nada é por acaso, tudo é planejado.
Sabemos que Darcy Ribeiro está correto quanto ao projeto urdido pelas elites de gerar  a crise na Educação. Sabemos também que os recursos destinados à Educação neste país são frágeis e podem ser retirados a qualquer instante, como o fez a ex-presidenta Dilma, ao reduzir em 8 bilhões o orçamento da Educação para 2016, inviabilizando qualquer projeto realmente social, como o Mais Educação. Mas também é verdade que os pais precisamos doar nosso tempo aos nossos filhos, incomodando-os e sendo incomodados por isso, para que seus sonhos não afundem, não sejam sepultados sob sete palmos memória abaixo, e que não se tornem, num futuro bem próximo, uma lembrança distante  e uma angústia a mais.

(Francisco Alves de Andrade, 09/16)

NA ESCURIDÃO MISERÁVEL

FERNANDO SABINO  “Eram sete horas da noite quando entrei no carro, ali no Jardim Botânico. Senti que alguém me observava, enquanto punha o m...