Mostrando postagens com marcador Artur da Távola. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Artur da Távola. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

SER É TOLERAR A DOR DE SABER-SE


Por: Artur da Távola

Em certo momento diz alguém: - "Eu descobri que não sou a pessoa mais importante. Nem pra mim mesma..."

Essa frase, constatação que mistura a lucidez e a pré-maturidade com uma depressão inevitavelmente infiltrada nas datas especiais, aniversário, principalmente, é rica de vivências..., por outro lado, a frase é primor de saúde: "Não sou a pessoa mais importante do mundo". Amadurecer é aceitar passar de protagonista a coadjuvante da vida, como disse certa vez, em carta, um competente cavaleiro desta távola. Descobrir-se como parte, como companheiro, como participante da tarefa comum de viver, sabendo que os próprios problemas não são os únicos nem mais importantes que o dos outros. Amadurecer é o legado dos anos que passam fecundantes. É a saúde, ou seja: "a capacidade de tolerar a frustração", segundo a observação sempre precisa do mestre.

Sim, não ser a pessoa mais importante do mundo, frustra. Frustra, porque o impulso interior é o de ser. Mas, tolerar as frustrações inevitáveis ou as frustrações inerentes ao processo de viver, eis a saúde. Afinal, acrescento eu, ser é tolerar a dor do saber-se. Sem "se saber "não se É..." Saber-se é reconhecer as defesas construídas com tanto brilho e engenho, logo é sair do pódio e voltar à arquibancada da vida, ao lado dos demais, compartilhando, dividindo, conhecendo limites. Nesse sentido, portanto, a primeira parte da fala: "descobri que não sou a pessoa mais importante do mundo" revela alguma saúde, preliminar de amadurecimento.

Já a outra parte, não. Embora envolta numa ilusão de maturidade, a outra parte ainda traz uma poluição, uma doençazinha nela embrulhada. A outra parte é a conclusão: "Nem para mim mesma". Não ser a pessoa mais importante do mundo, sim, ; é uma importante descoberta. Porém não ser a mais importante nem para si mesma, não o será para ninguém. A saúde é justo o oposto: deixar de ser pessoa mais importante do mundo para ser a mais importante para si mesma.

A pessoa que se supõe madura quando se despe da onipotente sensação de ser o centro do universo. Mas imagina que, por consegui-lo, ficou tão humilde, tão bacana, tão gente, que deixa de ter importância até para si mesma! Ai', adoece pela cura! Cai no excesso inverso errado. Deixa de ver a dimensão própria, que não está nem no excesso nem na falta de importância. Ainda não é liberdade, pois. A liberdade não é a posição oposta à dos tempos de ilusão, prisão ou alienação. A liberdade é o novo. A liberdade é a terceira e nova conquista. Exemplifico pelos conceitos de dependência e independência. Enquanto dependentes, as pessoas são escravas. Mas, a independência ainda está marcada como reação à dependência, logo é uma frente inversa o mesmo sistema: é o pólo oposto de uma mesma realidade. Assim, toda independência, ainda é de certa forma determinada, marcada ou poluída pela dependência anterior.

Então, não há saída? Há. É o novo, o criativo. O que rompe a imposição do dualismo bipolar, aprisionante. O zen. O que é? Não sei. Sei que é; e só se acha quando se pára de procurar. E só se procura quando se desiste de saber.

NA ESCURIDÃO MISERÁVEL

FERNANDO SABINO  “Eram sete horas da noite quando entrei no carro, ali no Jardim Botânico. Senti que alguém me observava, enquanto punha o m...