Quando cheguei
à casa de meu pai e o vi morto, eu sorri
Porque sei
que era exatamente o que ele faria se se visse morto
Ele estava
lindo, morto
Como sempre
fora
O rosto
rígido
A boca
entreaberta, como se quisesse desafiar num grande sorriso
As pessoas
sofriam, choravam
Ele se ria
de tamanha ingenuidade
E se pudesse,
diria com voz firme como sempre falara:
“Assim é a vida
Assim é a
morte
Não estamos
aqui para semente
Caminhamos
eu e a vida inteira de braços e mãos dadas
Agora é
momento de visitar a morte, o mistério
Passei a
vida toda nos desenganos da vida
Quero ver os
desacertos da morte
Se a vida me
fez feliz ou triste
Se tive
amores e traições se traí e amei em vida
Na morte
quero, se me for possível, amar, ser alegre e triste
Não fui
homem de fugir das agruras que a vida impunha
Serei
espírito de temer o que me espera?
Não, e parem
de chorar! cantem-me os parabéns
Não é com
choro que se enterra um homem
É com
aplausos que se vê a ascensão de um espírito!”
Quando o guardaram naquela urna escura
Pensei que fosse desabar
Parecia-me que as lágrimas guardadas fossem desaguar
Mas senti de súbito um alívio
Meu pai não estaria mais ali, nem aqui, nem acolá
Seu Luís iria finalmente descansar
Depois de 86 anos de lida
Desde pequenino
Imagino o filme de que ele foi personagem
Nossa quanta traquinagem
Nossa quanta brincadeira
Nossa quanta tristeza
Nossa quanta alegria
Quanta noite quantos dias
Finalmente descansou
Meu pai
Meu espelho
Meu orgulho
E espero que quando chegar a minha vez
Meu filho não chore
Apenas tenha carinho pelo que fiz e pelo que me espera
(Professor
Alves)