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A novela "Pedra Sobre Pedra" teve seu final apresentado no dia 31 de julho de 1992. Nesse dia papai faleceu. "Pedra Sobre Pedra" foi uma "novela das 8". Papai faleceu às 17h.
"Pedra Sobre Pedra" contava a história de Murilo Pontes e Pilar Batista. Casal que se amou na juventude e vinte e cinco anos depois via sua história se repetir através de seus filhos. Papai recomeçou a contar sua história quando chegamos em Independencia em janeiro de 1976. No dia 27 de julho de 1992, papai acordou dizendo que estava se sentindo mal. Particularmente não dei muita atenção. Minha relação com ele era marcada por muitos desencontros. Existia uma indiferença recíproca. Hoje acredito que existia mutuamente um amor contido. Não nos rendemos aos nossos sentimentos. Evitei sempre pensar na possibilidade de amá-lo (a gente só descobre isso depois que se vão) porque achava que ele também não me amava. /
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Papai foi internado na Clínica Santa Maria no dia 28 de julho. Quando quis visitá-lo pedi a minha querida amiga Laurice para acompanhar-me ao hospital (não tinha coragem de ir sozinho porque não sabia o que lhe dizer). Recebeu a liberação do Dr. Joel Martins para viajar e internar-se em Fortaleza no dia 30 de julho, numa quinta- feira. Era o dia do penúltimo capítulo de "Pedra Sobre Pedra". Antes de ele partir fui à Praça da Matriz, como de costume, bebericar com os amigos e curtir a ressaca do final das festas de Sant'Ana. Só que ao chegar à praça, senti uma vontade enorme de voltar para casa e vê-lo antes de partir. Uma força estranha me pedia para retornar (coisa que costumeiramente não fazia em todas as suas viagens). Retornei para casa no momento em que ele entrava no seu carro (um Del Rey branco) deitando-se no banco traseiro (nunca havia visto papai nem sentar-se num banco traseiro de carro de terceiros) e achei "aquilo" diferente. Antes que meus irmãos (Wellington e Naelson) entrassem e partissem, resolvi despedir-me e ali pedir-lhe a benção. Ao vê-lo deitadinho, com o corpo miúdo e a cabeça encostada no travesseiro, estendi-lhe a mão: "A benção papai!". Ele levantou a cabeça, olhou-me, agarrou minha mão: "Deus te abençoe meu filho. Desta vez eu não volto mais!". Não acreditei. Achei até que ele estava fazendo uma "chantagenzinha emocional" para me comover. Enquanto o último capítulo da novela "Pedra Sobre Pedra" rolava na televisão, no dia 31 de julho de 1992, o telefone tocou e com ele a notícia de sua morte através de uma tia: "Enock, eu acho que Badeco morreu". Descobri que poderia ter tido com ele uma relação mais forte. De repente ele se fora. Uma crueldade do destino estava acontecendo comigo.
A morte era certa. É certo. Queria ter tido mais tempo para aproveitar sua presença ao meu lado. Lembro-me demais de ele dizendo: "Desta vez não volto mais". Quanto tempo perdido! "Não volto mais"... E ele não voltou mesmo. De Fortaleza seu corpo seguiu para o São Rafael, no Rio Grande do Norte, para ser enterrado. A novela teve seu fim no dia dia 31 de julho de 1992. Teve fim também a presença física de papai no plano terrestre.
Enock Fonseca, Independência Ceará.