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quarta-feira, 14 de maio de 2014

NUNCA É CEDO, NUNCA É TARDE



Tem tempo
que o tempo  dá
Tem tempo
que o tempo tira
Tem tempo
Que o tempo encolhe
Tem tempo
Que o tempo estira
Tem tempo
Que o tempo dá tempo
Que o próprio tempo
Se admira
(Salvador Bonfim,
in Carisma de um Provinciano)

Aos dezesseis anos, Álvares de Azevedo iniciou uma profícua obra literária que lhe renderia o posto de principal poeta ultrarromântico. Mas sua produção não se reduziu apenas a poesia. O bardo era bom em tudo o que fazia, desde traduções de Lord Byron a criar peças à Shakespeare.  Sua obra mais importante, Noite na Taverna, demonstra toda a evolução de uma mente jovem e brilhante. Faleceu aos vinte anos incompletos, mas nos deixou vasta obra e como maior legado a ideia de que nunca e cedo para se fazer aquilo a que nos propusemos.
Aos vinte e sete anos idade, muita gente olha para trás e, se ainda não fez nada de extraordinário, pensa que tudo está acabado. Entretanto, aos vinte e sete anos, Van Gogh, sem nunca ter dado uma pincelada, entrou para um curso de desenho, para se tornar o maior pintor impressionista holandês. Apesar de uma vida frustrada, sem realizações pessoais, Van Gogh é um bom exemplo de que a qualquer momento podemos  reescrever  nossa realidade.
Em 1934, com quarenta anos de idade, portanto além da curva citada por Dante, Graciliano Ramos, alterando o rumo de sua comédia,  escreveu seu primeiro romance, São Bernardo, para não mais largar a pena e construir uma das mais ricas obras da literatura brasileira e da mundial. Seu legado maior: nunca é tarde para se iniciar aquilo para que fomos enviados ao mundo.
Com setenta e cinco anos, Salvador Bonfim, agricultor na cidade de Independência no  Ceará, matriculou-se no Mobral a fim de aprender escrever, pois tinha um sonho: publicar um livro. Aos 84 anos, nos convidou para o lançamento de seu terceiro livro de poesia, Carisma de um Provinciano, de onde retiramos a epígrafe desta crônica.
Álvares de Azevedo escreveu toda sua obra em apenas quatro anos, começando-a, pois, precocemente! Van Gogh, com suas incertezas, suas angústias, buscou no desenho, na pintura sua realização pessoal, aos vinte e sete anos, tornando-se ícone de toda uma geração e referência para as demais! Graciliano Ramos despertou para o cenário literário apenas aos quarenta anos, produzindo uma obra que inspirou grandes nomes, como José Saramago! Salvador Bonfim, aos setenta e cinco, iniciou seu aprendizado escolar para escrever livros também de poesia e o fez com grande maestria. O que então dizer de Oscar Niemeyer que, aos cem anos, depois de ter realizado tudo que uma pessoa pode pensar em fazer, resolveu se matricular na academia para aprender física e filosofia! Queria ele apenas deixar mais um presente para nós. Queria nos dizer nunca é tarde para aprender, para produzir, para viver.

(Francisco Alves, maio de 2014)