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terça-feira, 17 de junho de 2014

ESCRITO PELAS ESTRELAS


Não existem estranhos.
O que há são amigos
que ainda não nos foram
 apresentados.
(Charlie Chaplin)

                Velha História, de Mário Quintana, o eterno poeta de alegrete, nos conta a provável história entre um homem sério, que se vestia de negro e tinha um ar preocupado, e um peixinho pequenino, de escamas azuladas e grande ar de inocência. O que torna verossimilhante essa fantástica fábula são os mesmos fatores que tornaram possíveis duas outras  histórias extraordinárias que narro a seguir.
               
A primeira vem de um romance de ficção e se reporta à amizade entre dois adolescentes com câncer em estado terminal. O que torna inverossímil e ao mesmo termo provável esse interminável laço é a distância que os envolve numa aura de poesia em busca de suas últimas realizações. Enquanto pessoas saudáveis estão nesse momento em busca da morte pelo desencanto extraqualquer coisa, eles buscaram, não solução para seus males, irreversíveis, mas força para viverem os últimos instantes. É, amparados um no outros, que veem suas vidas se prolongarem por tempo indeterminado, até que, por fim,  a morte os une definitivamente.
               
                A outra é um fato real, mas que se fosse ficção, também não causaria estranhamento. É a história de um americano e um motoboy brasileiro, unidos por uma paixão chamada futebol. Que magia tem esse esporte de atender aos apelos das estrelas e então se realizar para que destinos possam se encontrar! Como diria Caetano, “é incrível a força que as coisas parecem ter, quando precisam acontecer”. Eu não vi e não ouvi a história por completo, mas acho que basta a ideia do aluguel de um lugar para ficar numa comunidade humilde como Itaquera, próximo ao local de abertura da copa, a vontade de passear, conhecer outro modus vivendi, o encontro quase fortuito com o motoboy, o sorriso, a aproximação magnética, como dois ímãs que se atraem pelos opostos. Imagino em outra vida, os dois destinos separados abruptamente. Amigos, cônjuges, pai e filho? Não importa. Lá na pátria maior, os dois se buscando. E aqui os dois se reencontrando. Parece que o americano quis ficar na humilde moradia do novo amigo, que surpreso recebeu das mãos daquele o ingresso tão sonhado para assistir à estreia do evento maior do futebol. Não por pagamento, mas por coroamento do contrato feito na outra pátria, a maior.

É o mesmo sentimento que tornou possível a amizade entre o peixinho e o homem, entre a jovem e o jovem do romance de John Green, que uniu brasileiro e americano. É o mesmo sentimento que torna possível o que não tem explicação. Isso se chama AMOR. Esse sentimento maior, que a todo instante é confundido com outros menores. É o AMOR imensurável, divino, sublime, coordenado do alto pelas estrelas pela diafaneidade do invisível que envia à terra, a todo instante, a energia de que precisa a humanidade para sua evolução.
(Francisco Alves, junho de 2014)  



terça-feira, 12 de abril de 2011

VELHA HISTÓRIA

        Li este texto uma vez, faz muito tempo. E por ele me apaixonei. Já era apaixonado por Mário Quintana. Depois passei a utilizá-lo em minhas aulas. Sempre contando a história, nunca a lendo. Meus alunos e alunas também se apaixonam por ela quando a ouvem. Certa vez uma aluna me confidenciou que encontrara a versão original, mas que gostara mais da minha versão, que não altera o texto original, muda apenas algumas palavras e/ou frases. Um aluno me encontrou certa vez no "shopping" e me pediu para eu colocar esse texto em meu blog. Para atendê-lo, teclei-o abaixo, do modo como sempre o profiro em sala. Que Mário me perdoe a pretensão

Mário Quintana, Poeta de Alegrete

        Era uma vez um homem que estava pescando, até que pescou um peixinho. Mas o peixinho era tão pequenininho, tinha um azulado tão indescritível nas escamas e um ar de inocência deveras aparente, que o homem morreu de pena. Tirou o anzol da garganta do coitadinho, untou-a com iodo e o colocou no bolso traseiro da calça para que o animalzinho sarasse no quente. 
         Desde então os dois tornaram-se amigos inseparáveis. Aonde o homem ia o peixinho ia atrás, a trote, igual a um cãozinho. Pelas praças, avenidas, elevadores. Era tocante vê-los, por exemplo, em um café.  O homem, vestido de preto, com uma das mãos segurava a xícara de fumegante moca, com  a outra lia o jornal, com  a outra fumava e com a outra cuidava do amiguinho, que, ao seu lado, tomava laranjada, por um canudinho feito especialmente para ele.
       Ora, deu-se que um dia os dois passeavam às margens do rio onde peixinho houvera sido pescado. De repente, o homem, adquirindo um ar mais grave do que de costume, disse para o peixinho:
         - Não, meu amiguinho, não me assiste mais o direito de tê-lo por mais tempo comigo. Tirá-lo do convívio de seu pai, de sua mãe, de seus irmãozinhos e irmãzinhas, de sua tia solteirona. Não e não! Desde já, volte para o seio de sua família e me deixe cá no mundo só e triste.
         Dizendo isso, o homem verteu copioso pranto, virou o rosto de banda e atirou o peixinho na água, e a água fez-se num terrível redemoinho, que foi serenando, serenando até que o peixinho morreu afogado. 

(Mário Quintana)