terça-feira, 12 de abril de 2011

VELHA HISTÓRIA

        Li este texto uma vez, faz muito tempo. E por ele me apaixonei. Já era apaixonado por Mário Quintana. Depois passei a utilizá-lo em minhas aulas. Sempre contando a história, nunca a lendo. Meus alunos e alunas também se apaixonam por ela quando a ouvem. Certa vez uma aluna me confidenciou que encontrara a versão original, mas que gostara mais da minha versão, que não altera o texto original, muda apenas algumas palavras e/ou frases. Um aluno me encontrou certa vez no "shopping" e me pediu para eu colocar esse texto em meu blog. Para atendê-lo, teclei-o abaixo, do modo como sempre o profiro em sala. Que Mário me perdoe a pretensão

Mário Quintana, Poeta de Alegrete

        Era uma vez um homem que estava pescando, até que pescou um peixinho. Mas o peixinho era tão pequenininho, tinha um azulado tão indescritível nas escamas e um ar de inocência deveras aparente, que o homem morreu de pena. Tirou o anzol da garganta do coitadinho, untou-a com iodo e o colocou no bolso traseiro da calça para que o animalzinho sarasse no quente. 
         Desde então os dois tornaram-se amigos inseparáveis. Aonde o homem ia o peixinho ia atrás, a trote, igual a um cãozinho. Pelas praças, avenidas, elevadores. Era tocante vê-los, por exemplo, em um café.  O homem, vestido de preto, com uma das mãos segurava a xícara de fumegante moca, com  a outra lia o jornal, com  a outra fumava e com a outra cuidava do amiguinho, que, ao seu lado, tomava laranjada, por um canudinho feito especialmente para ele.
       Ora, deu-se que um dia os dois passeavam às margens do rio onde peixinho houvera sido pescado. De repente, o homem, adquirindo um ar mais grave do que de costume, disse para o peixinho:
         - Não, meu amiguinho, não me assiste mais o direito de tê-lo por mais tempo comigo. Tirá-lo do convívio de seu pai, de sua mãe, de seus irmãozinhos e irmãzinhas, de sua tia solteirona. Não e não! Desde já, volte para o seio de sua família e me deixe cá no mundo só e triste.
         Dizendo isso, o homem verteu copioso pranto, virou o rosto de banda e atirou o peixinho na água, e a água fez-se num terrível redemoinho, que foi serenando, serenando até que o peixinho morreu afogado. 

(Mário Quintana)

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