segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

UM PRESENTE DO TAMANHO DE UMA VIDA


         Era dezembro, véspera de natal,  de cujo ano não me lembro. Devia ser por volta de 1970, 1972, não sei mais. Há época, o tempo não corria, apenas andava e a passos lentos. Tão lentos que achávamos os anos eternos, ou porque não tínhamos o que fazer ou porque os dias tinham realmente 24 horas e não apenas 16 como aparentam ter hoje. Eu e meu irmão, um pouco mais velho que eu, íamos sempre à tarde para a esquina do quarteirão da rua onde morávamos e ficávamos até perto do anoitecer, quando voltávamos  a casa para esperar papai chegar.
            Havia um rapazinho, 12 ou 14 anos, que passeava de bicicleta rua acima rua abaixo. Era um dos pontos para os quais nossos olhos sonhadores se voltavam. Era bela a bicicleta vermelha, com o moço a conduzi-la, pra lá e para cá. Era possivelmente presente de natal antecipado, e nós nos contentávamos em sonhar com um presente daqueles, digo sonhar porque estava acima das posses de nossos pais. O moço era simpático e sempre sorria em nossa direção.
            Um dia daqueles, quando o sol já abaixava a guarda, ele sorriu e nos disse que no dia seguinte nós iríamos fazer um passeio com ele. Foram mágicas as suas palavras. Naquele dia não dormi, ansiava pelo passeio tão bem anunciado. No dia seguinte a ansiedade aumentava desproporcional à lentidão das horas. À tarde, mais cedo que antes, lá estávamos nós com o coração palpitando. A aceleração dos batimentos cardíacos era grande, tão grande quanto a nossa alegria ao vê-lo se aproximar, colocar-me na garupa e seguir. Não me importava o tamanho da viagem, tampouco o destino. Era grande a alegria que invadia meu ser. Depois foi a vez do meu irmão, em  seguida a minha de novo. E assim se seguiu aquele restante de tarde.

            Não me lembro se esses passeios se repetiram em outras tardes, mas para mim se repetem até hoje. Talvez tenham se repetido de fato, ou não. Não importa, o que importa é o tamanho da alma daquele garoto ao proporcionar tamanha alegria a crianças estranhas. Era natal, e não me lembra ter recebido um presente tão grande e significativo para minha existência.
            Um dia desses me encontrei casualmente com o homem em que se transformou aquele jovem. Estava sentado sozinho em um café. Por alguns instantes hesitei se devia cumprimentá-lo. Fi-lo e recebi um largo sorriso de agradecimento, como se estivesse devolvendo a ele o mesmo presente que me deu há tanto tempo.
    (Professor Alves)

           

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

A NACIONALIDADE DE JESUS



Chefes de vários países se encontraram. Todos defendiam que Jesus tinha nascido em seus respectivos países e indicavam as seguintes provas:


a) 3 provas de que Jesus era judeu:
- Assumiu os negócios do pai;
- Viveu em casa ate os 33 anos;
- Tinha certeza de que a mãe era virgem e a mãe tinha certeza de que ele era Deus.

b) 3 provas de que Jesus era irlandês:
- Nunca foi casado;
- Nunca teve emprego fixo;
- O último pedido dele foi uma bebida.

c) 3 provas de que Jesus era porto-riquenho:- Primeiro, o nome dele era Jesus;
- Sempre teve problemas com a lei;
- A mãe dele não sabia quem era o seu pai.

d) 3 provas de que Jesus era italiano: - Falava com as mãos;
- Tomava vinho em todas as refeições;
- Trabalhou no comércio.

e)  3 provas de que Jesus era californiano:
- Nunca cortou o cabelo;
- Andava descalço;
- Inventou uma nova religião.
 
f) 3 provas de que Jesus era francês:
- Nunca trocava de roupa;
- Não lavava os pés;
- Não falava inglês.

g) 3 provas de que Jesus era brasileiro:
- Nunca tinha dinheiro;
- Vivia fazendo milagres;
- Se ferrou na mão do governo.

Não foi possível chegar a um consenso sobre a nacionalidade de Jesus, mas todos concordaram com uma coisa:

- Judas, com certeza, era Argentino...
 

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O CHAMADO
(Para Beatriz, no dia do seu retorno ao céu)   

E Beatriz ouviu o chamado
Caminhou com seu passo calmo
Seu andar tenro
Seu passinho seguro
A voz ela já sabia de onde vinha
Ouviu a voz de sua mãe
“Bia, não se afaste”
Na pujança dos seus dois anos
Já conhecia aquela outra voz
Como era conhecida!!!
Havia vozes nas proximidades
Outras crianças chamavam
“Vem Bia, pra cá”
Teve vontade
a outra voz dizia pausadamente
“vem, meu anjo”
Ela foi
No espelho da piscina
Enxergou a si
O azul dos seus olhos...
O azul da piscina...
O azul dos olhos dEle...
A voz da mãe
“Cadê essa menina...”
A voz das outras crianças
“Vem Bia”
A voz dEle
“Vem, meu anjo”
Por um lapso
Por um átimo
Olhou mais uma vez atrás de si
A mãe se erguia
Viria buscá-la
Rápido pensou
Os dias passados...
As visitas dos tios...
As visitas aos tios...
Já havia se despedido
Colocou seu pezinho
E mergulhou para junto dEle.

(Professor Alves, 11/11)

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

A GRANDEZA DO MAR


Paulo Roberto Gaefke(No livro "Quando é preciso Viver" página 29)

Você sabe por que o mar é tão grande?
Tão imenso? Tão poderoso?
É porque teve a humildade de colocar-se alguns centímetros
abaixo de todos os rios.
Sabendo receber, tornou-se grande. 
Se quisesse ser o primeiro, centímetros acima de todos os rios,
não seria mar, mas sim uma ilha.
Toda sua água iria para os outros e estaria isolado. 
A perda faz parte.
A queda faz parte.
A morte faz parte.
É impossível vivermos satisfatoriamente.
Precisamos aprender a perder, a cair, a errar e a morrer.
Impossível ganhar sem saber perder.
Impossível andar sem saber cair.
Impossível acertar sem saber errar.
Impossível viver sem saber viver.
Se aprenderes a perder, a cair, a errar, ninguém mais o controlará.
Porque o máximo que poderá acontecer a você é cair, errar e perder.
E isto você já sabe.

Bem aventurado aquele que já consegue receber com a mesma naturalidade
o ganho e a perda, o acerto e o erro, o triunfo e a queda, a vida e a morte.

Extraído do site: Meu Anjo

terça-feira, 15 de novembro de 2011

EVALDO BRAGA E CARLOS ALEXANDRE: UMA COINCIDÊNCIA?

http://jconlineblogs.ne10.uol.com.br/toques/f

     
            Era o início dos anos 70. Uma das músicas que mais se ouviam no rádio era “Sorria, sorria”, de Evaldo Braga. Sinto ainda as vibrações daquela época, em que não tínhamos noção do que ocorria na política, afinal tinha apenas 8 anos de idade, e as únicas notícias que se ouviam pelo rádio eram as de assassinato de mulheres ou as de futebol. Quase todos os dias o programa A Cidade e A Lei divulgava essas atrocidades cometidas por homens contra suas companheiras, em geral.
          No dia 30 de janeiro de 1973, os jornais trouxeram a imagem de um acidente. Era terrível a cena! Uma carreta e um monte de ferros retorcidos, que antes houvera sido um carro. Era o fim de um jovem negro que conseguira fama, dinheiro, mulheres , depois de uma infância paupérrima de abandono pela própria mãe em uma lata de lixo. As áudio-exibições das músicas do Ídolo Negro ecoaram pelo Brasil inteiro e muitas pessoas choraram.
          Algum tempo depois, surgiu uma voz semelhante à de Evaldo Braga. Não sei se essa semelhança não foi notada ou apenas desprezada. Carlos Alexandre, aos 21 de idade, como seu ídolo Evaldo Braga, desprezado como ele e criado por terceiros, explodia no mercado fonográfico, as rádios tocavam suas músicas o dia inteiro. À época as notícias que mais me chamavam à atenção, porque eram as mais frequentemente divulgadas, continuavam sendo os uxoricídios e os sensacionalismos futebolísticos. Feiticeira ganhou o Brasil e parte dos países que falam a língua portuguesa, sobremaneira Portugal. Mas...
http://www.minhahistoria.com.br/3/fot

          … Em 31 de janeiro de 1989, dezesseis anos após a morte de Evaldo Braga, Carlos Alexandre, nas mesmas circunstâncias, perdia a vida. As imagens e as comoções não foram menos trágicas. E ainda hoje se ouvem as músicas de um de outro. Canta-se ainda o amor, mesmo que frustrado, mesmo que em forma de lixo, mesmo que antitético entre o riso e o choro, entre a cruz e a fama, entre a arma de vingança dos meninos pobres e a sociedade que os despreza ou os usa, como as mulheres assassinadas Brasil a fora, feiticeiras de sua própria desgraça, escravas do machismo insolente e perpétuo, que não cabe mais numa sociedade livre.
(Professor Alves)

domingo, 13 de novembro de 2011

EFEMERIDADE



         Não, eu não amanheci melancólico. Acho que é um adjetivo com o qual não convivo. Não sou de olhar o dia e desejar que já fosse noite, ou olhar a lua e desejar que o sol estivesse a pino. Portanto não sou melancólico. Apesar de refletir sobre a efemeridade do tempo, da vida e do que já fui. Estou sim é chateado com a arrogância humana. Como há pessoas que se acham imortais! Sim pois só esse sentimento justifica, por exemplo, a arrogância, a petulância do nosso governador ao se defrontar com os servidores exigindo seus direitos. O que me levou a essa reflexão foram duas coisas. Primeiro uma propaganda de uma escola particular. A segunda foi a lembrança de um amigo a respeito de um ex-governador já morto.
       A propaganda da escola a qual me referi faz referência a, desculpe a tautologia, equipamentos, como bip, vídeo cassete, máquina de datilografia. Que já estão no esquecimento. As novas gerações já não sabem o que representou isso. Em seguida o publicitário apresenta a Educação como algo que dura para sempre. E conclui: “invista em algo realmente duradouro”. Xou de bola, com x e tudo mais. Tudo nessa vida é passageira, menos o trocador, o motorista e o conhecimento. O governador em pouco tempo será um monte de ossos putrefatos na “frialdade inorgânica da terra”, para lembrar augusto dos Anjos, imortal.
Todos mortos, profundamente mortos

      Quanto ao ex-governador morto, não há nada do que falar, só que ele se foi, como todos nós iremos, e só deixou alegria. Assim é com todos os ditadores, com todos os bonzinhos, estes deixarão saudades. Aqueles, repito, só alegria. Lembro-me fortuitamente de Hitler, Mussoline, Manuel Bandeira, “Estão todos dormindo/ Estão todos deitados/ Dormindo Profundamente”.
(Professor Alves)


domingo, 6 de novembro de 2011

A RUA DOS POSTES



          Passou a chamar-se Rua dos Postes porque foi a primeira rua em que apareceram aqueles gigantes de cimento. Eram finos e compridos. Um dia chegou um caminhão e os despejou ao longo da Outra Rua. Era assim que chamávamos a Rua Rio Tocantins antes dos postes. A novidade foi tanta que mudamos o tratamento, e passou a se chamar simplesmente Rua dos Postes.
           Passamos a ter um respeito quase que imperial pelos habitantes daquela rua. Íamos lá agora com apenas um intuito, ver os postes estirados ao longo do caminho. Os moradores de lá, sobretudo os meninos da nossa idade, nos olhavam com desprezo, e nós os víamos com submissão. Talvez por isso tempos depois ainda tínhamos certa admiração por aquela gente.

            Em breve nossa rua também foi agraciada com os postes. Mas não tínhamos tanto orgulho deles. Os da outra rua, bem mais espertos, foram os primeiros a se levantarem de seu sono secular. Para cumprirem seu trabalho que era iluminar a rua às noites. Os nossos demoraram mais tempo para cumprir sua missão, por isso agora íamos à rua dos postes para ver, mirar as luzes amarelas que brotavam dos pratos brancos que pendiam no alto dos postes. Quando as luzes chegaram aos nossos magricelas cinzentos, já não havia novidade. Mas pelo menos não precisávamos mais nos humilhar par ver a luz que não empretecia as paredes. Agora as luzes iluminavam mesmo e não soltavam o odor do querosene queimando.
          Junto com essas novidades veio a televisão. A partir de agora, à noite, ao invés de corrermos atrás das bandeiras ou brincar de roda, íamos à casa dos vizinhos mais afortunados, ver um pouco daquela luminosidade que continha imagem. Mais uma vez era a submissão que condicionava nosso comportamento. Eu e meu irmão tomávamos banho cedo, e, a contragosto de nossa mãe, íamos em busca dos raios iluminados que a televisão disparava com movimentos em preto e branco. Até que a televisão também chegou à nossa casa, e junto com ela uma leva de outras crianças menos afortunadas ainda que nós.

         Não sei porque escrevo essas lembranças. Talvez para fazer uma catarse, pois são muitas as lembranças que me acometem e me fazem refletir sobre o que de fato traz essa tal felicidade. Sei que aquelas humilhações a que nos submetíamos apenas para matar a curiosidade, ver os postes no chão, as luzes ou os raios da televisão não traziam alegria, traziam um sentimento de impotência diante de algo que não tínhamos. Não era nada que valia realmente a pena, mas que precisávamos ver, sentir. Certa vez, levantei-me do chão, onde nos era permitido sentar, e pedi, não sei ainda com que coragem, para tocar no vidro da televisão. Acho que riram, entretanto permitiram. Eu o achei duro, frio. A mesma sensação que guardo até hoje da televisão.

         Tudo era novo para nós, era o mundo novo entrando em nossas vidas. Antes tínhamos a lamparina, o rádio, a voz. Agora era a luz, as imagens e com tudo isso a angústia de não ter, de não ser o primeiro. Não sei se isso nos torna tímidos, menores, submissos. Mas sei que aquele sentimento que tive no dia em que o caminhão chegou na outra rua, não na minha, e despejou os postes, me perseguem por toda a existência. Como se fosse meu destino nunca ser o primeiro nunca ter o direito de causar inveja nos outros.
(Professor Alves, novembro de 2011)