segunda-feira, 1 de julho de 2013

VAMOS MUDAR DE ASSUNTO












vamos mudar de assunto

VAMOS MUDAR DE ASUNTO
PARA NÃO CONTER A EUFORIA
PRA NÃO LEMBRARMOS O OUTRO
PARA NÃO ESQUECERMOS DE NÓS

VAMOS FALAR DE FLORES
PARA NÃO DIZEREM
PARA NÃO CLAMAREM
PARA NÃO  SUFOCAREM

VAMOS FALAR DE AMORES
PARA NÃO MORRERMOS SEM
PARA NÃO SENTIRMOS DORES
PARA  NÃO VIVERMOS COM

VAMOS FALAR DA INFÂNCIA
PARA NÃO CRESCERMOS LOGO
PARA NÃO VIVERMOS MUITO
PARA NÃO SERMOS PEQUENOS

VAMOS FALAR DE CRISTO
PARA NÃO SERMOS LÓGICOS
PARA NÃO VIVERMOS SALVOS
PARA NÃO SENTIRMOS MEDO

VAMOS FALAR DE VERÃO
VAMOS FALAR DA CHUVA
VAMOS FALAR DE TI
VAMOS ESQUECER DE NÓS

VAMOS MUDAR DE ASSUNTO!


(Professor Alves, um dia após a vitória da seleção)

terça-feira, 7 de maio de 2013

ESGARÇAMENTO DA POLÍTICA, FREI BETO





Frei Betto
Escritor e assessor de movimentos sociais
Esgarçar: afastarem-se, soltarem-se os fios de um tecido(Caldas Aulete).
Quem é direita e esquerda hoje no Brasil? Eis um dilema shakespeariano. A direita, representada pelo DEM, se acerca do PMDB e, na palavra do senador Agripino Maia, propõe "oposição branda” ao governo Dilma Rousseff, que se considera de esquerda.
O PPS do deputado Roberto Freire, versão ao avesso do Partido Comunista, apoia as forças mais retrógradas da República. O PDS de Kassab e o PMDB de Sarney ficam em cima do muro, atentos para o lado em que sopram os ventos do poder.
Como considerar de esquerda quem elege Renan Calheiros presidente do Senado, e Henrique Alves, da Câmara dos Deputados. Você, caro(a) leitor(a), qualifica como de esquerda quem se apoia em Paulo Maluf, Fernando Collor de Melo e Sarney?
Desde muito jovem aprendi que a esquerda se rege por princípios e, a direita, por interesses. E hoje, quem coloca os princípios acima dos interesses? Como você, que é de esquerda, se sente quando se depara com comunistas apoiando o texto do Código Florestal que tanto agrada a senadora Kátia Abreu?
A esquerda entrou em crise desde que Kruschov, líder supremo da União Soviética, denunciou os crimes de Stalin, em 1956. Naquela noite de fevereiro, vários dirigentes comunistas, profundamente decepcionados, puseram fim à própria vida.
Depois que Gorbachev entregou o socialismo na bandeja à Casa Branca, e a China adotou o capitalismo de Estado, a confusão só piorou.
Muitos ex-esquerdistas proclamam que superaram o maniqueísmo esquerda x direita, inadequado a esse mundo globalizado. Mera retórica para justificar o aburguesamentos de quem, em nome da esquerda, alcançou um estilo de vida à imagem e semelhança dos poderosos da direita: muita mordomia e horror, como confessou o general Figueiredo, ao "cheiro de povo” (exceto na hora de angariar votos).
Ser de esquerda, hoje, é defender os direitos dos mais pobres, condenar a prevalência do capital sobre os direitos humanos, advogar uma sociedade onde haja, estruturalmente, partilha dos bens da Terra e dos frutos do trabalho humano.O fato de alguém se dizer marxista não faz dele uma pessoa de esquerda, assim como o fato de ter fé e frequentar a igreja não faz de nenhum fiel um discípulo de Jesus. A teoria se conhece pela práxis, diz o marxismo. A árvore, pelos frutos, diz o Evangelho.
Se a prática é o critério da verdade, é muito fácil não confundir um militante de esquerda com um oportunista demagogo: basta conferir como se dá a relação dele com os movimentos populares, o apoio ao MST, a solidariedade à Revolução Cubana e à Revolução Bolivariana, a defesa de bandeiras progressistas, como a preservação ambiental, a união civil de homossexuais, o combate ao sionismo e a toda forma de discriminação.
Quem é de esquerda não vende a alma ao mercado.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

CIDADANIA





















Que palavra é essa
sem efeito
que efeito é esse sem causa
que causa é essa
que não se entende.

Existe um homem pobre
existe um filho sumido
existe um filho vivo
existe só descaso.

Que nome é esse
sem sentido
sentido sem razão
razão sem História
História com eco.

Eco de tristeza
eco de medo
eco de fome
eco sem nome.

(Professor Alves)

quinta-feira, 7 de março de 2013

DIA INTERNACIONAL DA LUTA DA MULHER


          Amanhã, oito de março, é comemorado o dia internacional da LUTA da mulher. Sempre friso a palavra luta por achá-la extremamente útil a esse contexto. Há um monte de dondoquinhas por aí gemendo que querem ganhar chocolate, flores, presentinhos. Esquecendo que mulheres viraram churrasco, foram violentamente queimadas por lutarem por seus direitos. Se as mulheres hoje podem escolher uma profissão, se podem escolher seus governantes e até escolher seus maridos é porque muitas lutaram por isso. E a luta continua. Numa sociedade machista, em que a mulher, iludida pela mídia, agrava dia após dia a sua condição de objeto sexual, é preciso que se tome consciência da libertação feminina. Mas que essa libertação não se dê apenas no campo da sexualidade, mas seja plena. Plena de amor ao próximo, de respeito por si mesma, de amor pelos filhos, por quem são tão responsáveis.
               Gostaria do fundo do meu coração desejar a todas as mulheres, sobretudos as adolescentes daqui e do mundo inteiro, que suas vidas sejam sem nenhum sofrimento, que sejam como as águas mansas de um lago manso, sem perturbações sem agruras, nem escarpas, nem espinhos. Mas que se um dia encontrarem-se diante de situações embaraçadoras, constrangedoras, advindas das contingências do dia a dia ou geradas por pessoas mal intencionada, que saibam erguer  o  coração para o céu, pois erguer as mãos é fácil, para, primeiro de tudo, agradecer a Deus por isso, porque agradecer só pelos bons momentos, pelas bonanças não tem graça nenhuma; depois  para perdoar a essas pessoas do fundo da alma, desejar-lhe toda felicidade do mundo, pois perdoar bobagens e desejar boa sorte só aos  nossos amigos também não tem graça mesmo, pois foi essa o grande ensinamento que o mestre nos deixou. E só então buscar na LUTA a felicidade, temporária, uma vez que é nessa felicidade temporária que encontramos forças para as novas batalhas que se nos avizinham.
               Gostaria ainda de lembrar que LUTA aqui não traz a ideia do conflito interpessoal, mas o conflito que travamos dentro de nós, para vencer os medos, as angústias, a falta de vontade que nos assola sempre que queremos ser pessoas melhores, sem maldade, sem ódio. Desejo então que nessa LUTA as mulheres possam se libertar de tudo, do machismo, da mídia que deturpa suas almas, dos medos, de seus próprios egoísmos.
(Professor Alves, 07/03/2013)

segunda-feira, 4 de março de 2013

A BARBEARIA E A CAIXINHA DE SURPRESA



              
        Ontem fui à barbearia. Costume que tenho desde vidas pregressas. Inclusive, salvo engano, já fui barbeiro numa das estadas por aqui. Pois bem, estava lá nesse espaço mais que democrático, onde as pessoas podem torcer livremente e manter uma saudável discussão futebolística. Estava juntamente com meu filho, que é para ele também criar gosto.
               O assunto não podia ser outro. Ceará e Fortaleza na final da copa Nordeste. Intrometi-me algumas vezes para lembrar que os dois tinham que passar pelos seus adversários desse domingo, Asa e Campinense, respectivamente. Mas o otimismo travava a racionalidade de alguns, torcedores dos dois principais times da capital cearense. Fiz-lhes lembrar do episódio ocorrido ano passado, quando o Fortaleza sucumbiu diante do Oeste de São Paulo, em pleno PV. “Mas isso já está superado” dizia uns. “O mesmo raio não cai sobre a mesma cabeça duas vezes”, retrucava outros. E assim saí da barbearia de cabeça feita, literalmente, e derrotado no debate.  
               Pena que à noite a barbearia estava fechada. O certo é que o raio não caiu sobre a cabeça do Fortaleza pela segunda vez, mas na cabeça do Ceará. Não quero o mal dos dois times. Até queria que os dois fizessem a final dessa copa, para adiar a participação das onzenas principais na segunda fase do campeonato cearense.  Mas quis o deus do futebol que se repetisse pela zilionésima vez o ditado que diz “o futebol é uma caixinha de surpresas”. E que caixinha, hem! No Rio os torcedores do Flamengo também pagaram o pato. A caixinha também se abriu para nós rubro-negros. 

domingo, 27 de janeiro de 2013

FALTA INJUSTIFICADA




               Chamava-se Anacleto e, como seu nome, era uma pessoa simples, conservadora. Dir-se-ia cumpridor dos direitos e deveres. No trabalho era infaltável, inchegável atrasado. Mas não criticava seus companheiros, quando o faziam. Tinha dó. Coitados, sempre que precisavam faltar ao trabalho ou chegavam atrasados, era devido a uma quase tragédia. Era a mãe ou um pai que passava dessa para uma melhor, um acidente com o filho pequeno, um desentendimento sério entre familiares. Quando isso ocorria, Anacleto não deixava de perscrutar discretamente o chefe retirar da gaveta um carimbo, que, depois de passar na almofada, pressionava contra o cartão de ponto: FALTA JUSTIFICADA. O mesmo carimbo servia para os atrasos, nesse caso, o funcionário não batia o ponto na saída.
               E foi num dia desses comuns, que Anacleto não compareceu ao trabalho pela manhã. Os colegas e o chefe já calculavam o tamanho da tragédia. Telefonaram pra sua residência, mas ninguém atendeu. Celular não tinha, pois esta história se passou na época em que esse instrumento ainda não havia sido difundido. Quando Anacleto chegou à tarde com um grande sorriso nos lábios e um ar de felicidade de fazer inveja, o patrão o olhou com certa desconfiança e o chamou-o ao birô, (Ah, nessa época ainda havia birôs. ) como sempre fazia. Inquerido por palavras e expressões faciais, certo de que seria perdoado e sua falta justificada, contou ao chefe o que ocorrera:
               — Pois é chefe. O Sr. Me desculpe pela falta de hoje de manhã, mas é que houve algo muito bom que me fez chegar tão atrasado. Quando vinha para cá, hoje pela manhã no horário de sempre, depois de tomar um cafezinho no bar de seu Ayrton, a pé mesmo já que o médico recomendou caminhada, mas como não tenho tempo, sempre venho caminhando. Pois bem, quando ia passando pela pracinha, deparei-me com Ana Amélia. O senhor precisava ter visto ela, como está linda, mais ainda que quando éramos jovens. Ela me abriu os lábios num sorriso bonito, com seus dentes branquíssimos, que mais pareciam ter saído de uma dessas propagandas enganosas de pasta de dente. Sentamo-nos no banquinho da praça e ficamos fitando um ao outro. Não dissemos nada, nossos olhos estavam observando nossas lembranças, os nossos lábios saboreando ainda o último beijo. Não discutimos o porquê de nossa separação, não nos ensaboamos  na água com que se lavam roupas sujas. O destino é simples, mas engenheiro. Não devemos discuti-lo. Só tempos depois, chefe, é que falamos, lembramos os nossos segredos, sorrimos nossa infância, balançamo-nos no trapézio feliz de nosso namoro. Ah, os versos, que dedicávamos um ao outro! Havia um que era assim, eu adorava dizer para ela e ela amava ouvi-los de mim:
                                            “Quando um dia eu for teu e fores minha,
                                            O nosso amor conceberá o mundo
                                            E de teu ventre nascerão deuses!”
Ah, chefe, o Sr. Não imagina como essa manhã foi maravilhosa, como foi bom rever Ana Amélia. O Senhor deve estar se perguntando por que não ficamos juntos, mas isso não interessa. O que interessa é que nos conhecemos na adolescência e nos encontramos hoje. Ela está casada, há muito tempo, eu também, mas isso também pouco importa...
               Guiados pelo tom das palavras de Anacleto, alguns funcionários  formavam um pequeno grupo de curiosos, sorvendo suas palavras como um bálsamos para seus sofrimentos e até sentiam um pouco de inveja. Chegaram mesmo a suspirar quando perceberam que um uma lágrima atrevida pousava de leve no sorriso do colega. Anacleto findou suas palavras da mesma forma como as tinha iniciado, com um sorriso de felicidade e um olhar perdido no passado.
               O chefe ouviu atentamente a justificativa de Anacleto. Abriu a gaveta retirou dela o carimbo e pressionou contra o cartão de ponto do romântico faltoso:
FALTA INJUSTIFICADA!
(Professor Alves, 01-2013)

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

NO TEMPO DOS CORONÉIS




               Era a época em que os coronéis ditavam as ordens no nordeste brasileiro. Eram homens poderosos, que tinham direito sobre a vida e sobre a morte, mandavam prender, mandavam soltar e também mandavam bater. Rodeados de capangas, muitos advindos do cangaço, eram homens de posse e de política. Eram eles que elegiam e eram eleitos. Eleição servia apenas como um faz de contas. Democracia era palavrão, cheirava a comunismo e comunismo era coisa do demônio.
               Mas dentre esses cidadãos de poder, de mando, havia uns poucos de coração generoso, que se condoíam do sofrimento alheio e colocavam muitas vezes seus contos de réis a amenizar o sofrimento daqueles que pouco ou nenhum tinham. Coronel Epitácio Alves D’ângelo era um deles. Homem de terras a perder de vista, casa grande sem senzala, gado e muito dinheiro debaixo do colchão. Sua descendência remonta ao Alferes José de Fontes Pereira de Almeida Alves, fundador da cidade hoje denominada Morada Nova. A seu serviço, muita gente entre homens e mulheres, pretos e brancos. A religiosidade fê-lo construir uma capela, à qual vinha geralmente aos domingos um padre trazer-lhe a bênção, a ele e aos que ali frequentavam e aos que ali trabalhavam, pois filhos e mulheres não tinha, apesar da sua libido exagerada. Mas ninguém ousava duvidar de sua duvidosa masculinidade.
               Estava esse homem sempre cercado por pessoas a bajulá-lo, sempre em busca de um favor, de um auxílio de natureza diversa. Conta-se que por trás de sua cadeira de balanço, havia uma abertura na parede, encoberta por uma lâmina de madeira, em que guardava sempre uma boa quantidade de dinheiro para emprestar a quem tivesse necessidade. Humildemente o homem e aproximava do Coronel e pedia-lhe emprestado algum. Ele simplesmente apontava com o polegar a abertura na parede, e o indivíduo ia pegar  a quantia solicitada. Alguns dias, semanas, meses depois, o homem vinha, sem grande humildade, pagar-lhe o que devia. Coronel Epitácio apenas apontava a abertura e o homem, meio desapontado, lá ia pôr a quantia em dinheiro.
                              Mas entre pessoas honestas, há sempre aqueles que se acham espertos e confundem bondade com ingenuidade. Certo comerciante, de nome Otávio Cesário, desses que não perdem a oportunidade de abusar da bondade alheia, precisando urgentemente de um dinheirinho para repor o estoque de seu armazém, dirigiu-se à fazenda do Coronel Epitácio. E depois de muito bajular o benfeitor, confessou o real motivo de sua estada ali. O Coronel fez o gesto costumeiro, indicando a abertura na parede. O homem retirando a quantia necessária, retirou-se, com uma vênia ao poderoso homem.
               Algumas semanas depois, estava o Coronel fumando seu costumeiro charuto, quando se aproximou o comerciante Otávio para devolver-lhe o empréstimo. O Coronel fez-lhe o gesto costumeiro, o outro se dirigiu para lá, abriu a portinhola de madeira e fechou-a sem nada pôr lá. E saiu, se despedindo com um sorriso cínico, coroando sua esperteza. 

               Não se passou muito tempo desse ocorrido, Nosso amigo comerciante, Otávio Cesário, apareceu na fazenda do Coronel. Após alguns dedos de prosa, revelou-lhe o que queria: um pequeno empréstimo, um pouco maior que o anterior é claro. Epitácio D’ângelo, não interrompeu a conversa com um aliado político, mas o gesto de sempre foi repetido, ao que o comerciante, regozijante, dirigiu-se ao buraco. Seu rosto ficou lívido, quando não encontrou nada lá. Voltou meio contrafeito até à cadeira do Coronel e pedindo-lhe licença disse-lhe, tropeçando nas palavras:
               — O Coronel me desculpe... mas... lá na portinha... não tem nenhum dinheiro!
               O Coronel deu um sorriso breve, bateu com o leque no joelho levantou os olhos para o homem, que já suava de desapontamento, e lhe respondeu:
               — Se não tem nenhum dinheiro lá, é porque da última vez que o senhor veio abastecer, nada lá colocou.
               Dizendo isso, o coronel mandou chamar dois cabras brutos e ordenou-lhes:
               — Acompanhem O Sr. Otávio César até seu comércio e tragam de volta  o que ele levou e não devolveu, que há pessoas honestas precisando. Mas antes não se esqueçam de lhe dar uma bela sova, pro facínoras aprender a não fazer os outros de bobo. E assim se deu!

               Essa é uma das muitas histórias que meu pai, Luís Alves Domingos, me contava. Elas moldaram de forma pedagógica meu caráter. Não me tornei melhor do que devo ser, mas sempre que me encontro em situações que exigem uma conduta ética, me lembro delas e procuro seguir aquilo que elas buscam ensinar.
(Professor Alves)