sábado, 21 de junho de 2008

AMOR, UMA QUESTÃO DE DOAÇÃO

AMOR, UMA QUESTÃO DE DOAÇÃO
(Professor Alves)
“Ah! que delicioso é dar!Ser generoso que bela tentação!Uma boa palavra brota suavementecomo um suspiro de felicidade!”
(Brecht)
O amor é sem dúvidas o que há de mais interessantes quando se pensa em sentimento. Deve ser concebido assim quando espontâneo, mas não o é quando se quer sentir. Porque se eu resolvo sentir Amor ou preciso que sintam Amor por mim, então o Amor deixa de ser sentimento e passa a ser querer. Não querer no sentido de escolha, mas no sentido de ser capricho. É impossível simplesmente se dizer: “Me ama, vai, estou esperando. Eu te amo então tens de me amar também.”
Essa intimação é mais corriqueira, por incrível que pareça, do que se possa pensar. Quantas pessoas nesse momento (talvez na cabeça do leitor esteja latente essa idéia) estão planejando algo para se fazer amar. Tipo “Se não me amares, eu te mato” ou “Se não me amares, eu me mato”. E o pior é que tanto uma como outra estão sendo executadas. Quem não ama, e quem quer ser amado/a.
E assim o Amor segue, moeda de troca, pois é preciso ser amado para amar. Ou o eterno vilão da humanidade. Vidas são destruídas a todos instante por Amor. É o alcoólatra, que carrega sua cabeça inchada, sua mente embotada por memórias das quais nem mais se lembra; é o esfarrapado que, sem mendigar, conduz pelas ruas a amargura de sua miséria da falta de amor próprio; é o suicida mal-sucedido, cujos pulsos abertos em sulcos profundos lembram-no a todo instante do que já não pode esquecer; é o presidiário, que, no cumprimento de sua pena, perambula pelos corredores estreitos de seu passado, vigiado de perto pelo sangue fétido, jorrado do amor que nunca teve.
É preciso entender que o amor, antes de ser sentimento, é doação. Faz-se mister que entendamos ser mais feliz, do que quem recebe, quem dá, quem empresta, quem doa algo, sem pensar na recompensa que virá depois. Porque talvez ela não venha pelas mãos daquele a quem se doou. A vida é uma corrente do bem, se fizermos o bem, ou uma corrente do mal, se praticarmos o mal. É preciso que amemos “as pessoas como se não houvesse amanhã”, para que as pessoas nos amem com a mesma intensidade, mas sem que nos preocupemos com esse retorno. Livre, espontâneo. Como uma borboleta, que não escolhe onde pousar, pousa porque precisa, chegou a hora, não para deixar outro pouso enciumado, assim são as pessoas. Amam porque precisam amar, chegou o momento de amar. E cabe a qualquer um agradecer a pessoa amada por existir e se permitir ser amada. É o mínimo que de fato podemos fazer

PARA SERMOS FELIZES!

quarta-feira, 18 de junho de 2008

A INDIFERENÇA QUE FALTA

A INDIFERENÇA QUE FALTA

Quem passar hoje pela avenida Duque de Caxias, no trecho entre Barão do Rio Branco e praça Coração de Jesus, aqui em Fortaleza, e não for desapercebido vai perceber que algo está faltando.




Às vezes transitamos pelas ruas e não nos damos conta do que está ao nosso redor. Há uma fachada de bomboniere, há uma moça bonita, há um velho que esmola, há uma prostituta que se vende. Mas na nossa pressa simulada, não vemos o flagelo alheio nem queremos dar conta disso. É o nosso egoísmo que fala mais alto. Ou o nosso medo de nos depararmos com nós mesmos na nossa desgraça interior.


Mas era impossível não vê-lo. Ele estava lá. Indiferente a tudo e a todos. Se alguém tentasse fita-lo enquanto “catava comida entre os detritos”, para tentar entender seus porquês, ele certamente olharia com um desprezo tão grande que lhe enregelaria a espinha. Como quem dissesse “você não é menos miserável do que eu”. Ele era alto, negro e sujo. Sua sujidez (não quero usar sujidade porque esse termo não condiz com a sua verdade) o empretecia ainda mais. Os cabelos, à Bob Marley, armados de sua sujidez, caídos sobre os olhos amarelecidos, sua bermuda que antes foram umas calças jeans, rasgada atrás, a mostrar-lhe as nádegas, desafiadoras, impudentes, transformavam-no em um relicário de indiferença consigo mesmo e para com os transeuntes.


Mas hoje ele não está mais lá. Apareceu-lhe seu anjo da guarda e o levou de lá. Não, ele não foi para o céu, ele não está morto. Seu anjo da guarda não tem asas, não é feito de nuvens, não é aquele de que fala o livro santo. É um arcanjo de carne e osso. Ele não teve medo de que ali estivesse seu ego maldito, seu eu inescrupuloso. Aproximou-se dele, é certo, depois de muito relutar. Entendeu subitamente que por trás daquela massa humana disforme havia um cidadão. Compreendeu o óbvio: que todos temos família. E o levou de lá para junto da mãe, da irmã, da sua tia solteirona.


Qual seu verdadeiro nome? Não importa. Qual o nome de seu anjo? Também pouco interessa. Este tornou-se celebridade. Não porque roubou o dinheiro do povo, não porque desfila seminu de segunda a segunda em um programa imoral chamado BBB. Não é nosso interesse aqui falar em nomes, citar datas, idades, estados mentais. Mas simplesmente lembrar que há pessoas pelas ruas, e nós nada fazemos para melhorar sua condição. É preciso que entendamos que “é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã”, mesmo que alguma delas não tenha um nome, um lar, um cargo.
(Professor Alves, 20/02/2008)

A COMPREENSÃO DA BELEZA

COMPREENSÃO DA BELEZA
(Professor Alves)

Certa vez, meu filho chegou-me e disse que queria criar uma lagarta. Lembrei-me da frase que diz que não basta ser pai, tem que participar, e fomos atrás. Depois de muito procurarmos, um rapaz que trabalha na estação de tratamento aqui do condomínio disse que havia uma em um limoeiro. Nossa! Era um bicho asqueroso e feio. Pequeno, acinzentado, com uma carinha de coruja, parecia um pedaço de pau, desses que a gente fortuitamente quebra enquanto divaga sobre as incertezas da vida, para depois lançar fora. Mas fazer o quê, já que só tem tu, vai tu mesmo. Colocamo-la dentro de uma lata de leite devidamente furada, com bastantes folhas, para não ter de alimentá-la mais, era esse meu pensamento.

Dias depois, não me lembram quantos, resolvemos dar uma olhada. Todas as folhas tinham sido devoradas, a terra cheia de “bolinhas” escuras, e ela não existia mais. Em seu lugar jazia um casulo, que pela feição, estado e odor denotava ser a sepultura de um ente que, já em vida, parecia morto. Deixamo-lo lá às expensas do tempo.

Noutro dia (era um domingo), estávamos brincando de algo, quando o Victor deu um grito:

─ Pai, a lata está se mexendo!

Caraca, era verdade. A tampa, que havia sido posta sobre a lata, mas sem ser vedada, estava pululando. Quando a erguemos, vimos o verdadeiro milagre da vida: uma borboleta linda, amarelo-queimado, com detalhes pretos espanejava tentando sair de sua prisão. O Victor estava exultante, dentro de seus olhos havia toda a compreensão sobre a beleza das coisas e onde elas se encontram.
Daquele dia em diante, passei a refletir sobre esse tema. Percebi que o belo só existe quando se manifesta. Não há formosura naquilo que está enclausurado, fechado; no que teima em se mostrar insalubre, inodoro, incolor. É preciso que a maravilha desperte para ser notada. Quantas coisas pulcras não o são por estarem escondidas em si mesmas! Imagine onde está a beleza da chuva! Só a vemos depois que ela se abre em verdes campos e em coloridas flores! A beleza da noite! Só é vista quando as estrelas em todo seu esplendor se abrem em luzes pictóricas! A beleza da vida! Só a vemos e sentimos quando os corações se abrem em sorrisos e atitudes! Assim também são as mulheres.

A beleza feminina, precisa ser exercitada, e não há melhor exercício para desabrochá-la do que a vaidade de um sorriso, a elegância de gestos e as palavras pronunciadas com clareza e ternura. É preciso, pois, que as moças manifestem seu encanto, para que ele se torne visível aos olhos de todos. Obnubilar as graças e as formosuras, escondê-las, negá-las, impedindo que os outros as vejam e se regalem com elas, é um crime contra a humanidade. E toda avareza será castigada.
Por isso sejam belas e...

FELIZES!
(06/06/2008)

terça-feira, 17 de junho de 2008

AS TRÊS PENEIRAS

AS TRÊS PENEIRAS

Um rapaz procurou Sócrates e disse-lhe que precisava contar algo sobre alguém. Sócrates ergueu os olhos do livro que estava lendo e perguntou:
─ O que você vai me contar já passou pelas três peneiras?
─ Três peneiras? – indagou o rapaz.
─ Sim! A primeira peneira é a VERDADE. O Que você vai me contar dos outros é um fato? Caso tenha ouvido falar, a coisa deve morrer aqui mesmo. Suponhamos que seja verdade. Deve, então, passar pela segunda peneira: a BONDADE. O que você contar é uma coisa boa? Ajuda a construir ou a destruir o caminho, a fama do próximo. Se o que você quer contar é verdade e é coisa boa, deverá passar ainda pela terceira peneira: a NECESSIDADE. Convém contar? Resolve alguma coisa? Ajuda a comunidade? pode melhorar o planeta? arrematou Sócrates:

─ Se passou pelas três peneiras, conte!!! Tanto eu como você e seus irmãos iremos nos beneficiar. Caso contrário, esqueça e enterre tudo. Será uma fofoca a menos para envenenar o ambiente e fomentar a discórdia entre irmãos, colegas do planeta.
(Sócrates)

DIÁLOGO DA VIDA INTEIRA

DIÁLOGO DA VIDA INTEIRA

A existência inteira é um diálogo,
Nesse, entre pares, por demais franco!
Um jovem animado a discutir
Com um velho já de cabelo branco.

O jovem, elétrico, agita os braços,
Assim, não pára um minuto sentado.
O velho, a cismar, com um sorriso brando,
Fita o chão, antes, por ele riscado.

O jovem, rebelde, é uma fogueira,
De chama, sensação e atitude.
O ancião, observando, logo pensa:
“Assim já fui na minha juventude”

O jovem diz, entre riso nervoso:
─ Para mim, tudo tem que ser agora!
O velho ouve para depois falar:
─ O abraço o beijo, tudo tem sua hora.

Para o jovem, o gozo dessa vida
Precisa rápido se realizar.
O ancião, fitando a teia do tempo,
Diz: ─ Até isso, filho, pode esperar.

─ Por que tu és tão tranqüilo, sereno,
Se daqui a pouco tempo irás morrer,
Se em terra não te resta muito tempo?
Por que logo não te pões a correr?

Sorrindo, insoberbo, diz-lhe o velho:
─ Eu sou, ó criança, a eternidade.
Em breve deixarás então de ser jovem,
E, quiçá, chegues à minha idade.

­─ Se isso acontecer, continua o velho,
Transformar-te-á em sabedoria,
Aquilo que te atormenta agora
Será paz, não será mais correria.

─ O fogo que te queima as entranhas
E te leva a delírios passageiros,
Em breve, se transpuseres esse estágio,
Será água, terra e ar alvissareiros.

─ Tua paciência para te realizares –
Diz nosso jovem – deixa-me nervoso,
Preciso do fogo alimentador,
Sussurros, beijos abraço ardoroso.

─ Pensas que também não me aprazem?
– Indagou o homem sem idade –
Em minhas veias corre muita energia,
Pronta para enfim ser realidade.

─ É que sou como um arqueiro experiente,
Que espera o tempo certo para atirar,
Minha seta vai direto ao alvo,
Nunca atiro sem antes muito mirar.

─ És, jovem, como os arqueiros insanos,
Tens em mãos o melhor arco do mundo,
Mas, não tendo paciência nem tino,
Torna o projétil mero vagabundo.

─ Sou a águia do tempo, meu jovem,
Vôo alto, para o ser admirar,
Habito a amplidão do ego humano,
Também sou puma pronto para amar.

─ És angustiado como as galinhas,
Freneticamente ciscando o chão,
Esporeando pra tudo quanto é lado,
Gozo verdadeiro não encontras não.

─ Sou o aqui e o agora, ó moribundo,
Não sei o que será no amanhã!
És carne fraca já quase sem vida,
Ser fora do tempo, fruta temporã.

─ Sou água de março, tempo fértil,
Auspicioso, irrigando o sertão.
És outono, penúria, és o fim,
Folha podre decaída no chão.

─ Te enganas, minha pobre criatura,
Sou Gabriel, anjo da anunciação,
Em mim reside toda sabedoria
Sei, do mundo, a chave da criação.

Os dois, cansados dessa brigaria,
Abraçam-se, e para casa se vão,
Porque a casa deles dois é a mesma,
É um prédio chamado coração

Amor é o nome do sábio, paciente,
quieto e tranqüilo ancião.
O outro, que atiça os sentimentos,
Atende por este nome: Paixão.
(professor Alves, 05/08)

VERSO, REVERSO E VERSO

VERSO, REVERSO E VERSO

Esse trecho faz parte de um romance ainda inédito. Para entendê-lo: Daniel está em busca de respostas sobre suas encarnações anteriores e dirigiu-se até um casarão abandonado referido por sua amiga Aliel. Segundo a moça, eles teriam morado ali numa outra vida. Ao chegar ao local, ele desmaiou e teve visões de sua existência anterior, em seguida foi despertado pelo atual morador do velho prédio.

─ Nossa, faz tempo que eu tô aqui. – assustei-me, pensando que aquelas curtas cenas demoraram tanto para se passarem – Que horas são?
─ Vão dar oito horas – disse ele tirando um relógio, ou melhor, uma cabeça de relógio do bolso traseiro da calça.
─ Pois eu já vou, desculpe, tá.
─ Espere pra tomar um café. A gente aproveita e conversa, eu não converso muito. – Disse isso e apontou para a solidão dos aposentos em ruína. Aceitei. E enquanto tomávamos café ele me contou parte de sua vida.
Narrou que era filho de pessoas pobres e que cresceu sonhando em enricar. Começara a trabalhar desde cedo e quando já estava desistindo de ter uma vida de talões de cheque e carros importados, a vida lhe aprontou uma surpresa. Através de uma sociedade escusa com algumas pessoas ligadas a sindicatos, apossou-se de uma bolada e viu aí a oportunidade de abrir uma empresa. Logo era empresário no ramo de calçados e a vida tornou-se um entrar de dinheiro em sua conta bancária que não tinha fim. Era paparicado por muitos e desprezava a todos. “Tinha a impressão de que todos queriam o meu dinheiro, achava que as pessoas só se aproximavam de mim pela minha riqueza, pela minha opulência. E tratei de me afastar deles, principalmente dos amigos da infância e da adolescência, pois via neles o atraso, o passado de privações, as dificuldades em conseguir dinheiro para tomar uma cerveja, o aperto dos coletivos e a angústia de se não ter trabalho. Cheguei até a esnobar aqueles que me eram outrora os mais próximos, exibindo a eles, sem lhes oferecer, copos cheios de uísque caro. Com o tempo passei a esnobar também meus familiares e me isolei na minha fábrica e na minha mansão, com mulheres e falsos amigos. Ainda bem que não casei, não tive filhos, por isso, como diria Machado de Assis, não transmiti a ninguém o legado de minha miséria. Tudo o que a vida dá ela toma. Não importa o que seja. Se ela vir que você não merece, ela vem e leva. Pode ser não só riqueza material, mas também a miséria moral, a pobreza, ou uma doença. Ela te dá e ela vem buscar. Se você é bom, solidário ela tira de você essa bondade e te dá riqueza. Mas a sua bondade é inata, ela te deixa a opulência e devolve tua bondade, tua solidariedade em dobro. Mas se tua bondade é só fachada, ela te leva a opulência e te devolve não a bondade, mas a angústia e o orgulho para viver sem ninguém. Comigo foi assim. Quando dei por mim estava sem nada e sem ninguém. A ruína me veio rápido, como a opulência, confiei em pessoas às quais não devia dar crédito, aplicaram-me um golpe sujo e mero, zerei, até a casa a justiça confiscou. Os falsos amigos e as mulheres viraram gas, evaporaram, sumiram, não me queriam, como nunca me quiseram. O meu orgulho não me deixou sequer voltar para a casa de meus pais. Um dia, desesperado, tendo gasto os últimos centavos numa refeição, subi no alto de um prédio para me jogar, mas ouvi a conversa entre dois funcionários de serviços gerais do edifício. Um falava para o outro do filho que ia nascer, era o terceiro. Quando o outro perguntou se dava para alimentar três filhos mais a mulher, ele respondeu que sim, que cada filho que nasce é a resposta de Deus de que devemos continuar lutando pela sobrevivência, é a resposta de Deus de que o mundo deve continuar. Ele falava do filho que ia chegar com tanto carinho, com tanto amor que sua voz embargava. E eu ali querendo me matar. Naquele momento eu tomei uma decisão. Decidi que ia voltar a trabalhar para depois conquistar as amizades que jogara fora, principalmente a de meus pais e meus irmãos. Mas algo me incomodava, eu não podia continuar ali no Maranhão eu precisava purgar meus erros longe dali. Foi aí que resolvi vir aqui para Fortaleza. Cheguei faz duas semanas. Como não tinha onde morar, vim para cá. Coloquei minhas roupas que sobraram no chão e elas me servem de cama, enquanto eu as engomo com a quentura e o peso do corpo, numa relação de cooperação. Uso somente duas mudas de roupas. Quando estou usando uma, a outra está enxugando e assim vai. No começo desta semana, consegui um emprego, amanhã talvez eu alugue uma quitinete...”
Ao dizer essas últimas palavras, com a voz pausada, ele se virou simulando remexer o fogo para esquentar o café. Aproveitei o silêncio para me despedir. Já na rua, após saltar as grades, ainda o ouvi chamar:
─ Ei, não se esqueça do que lhe contei, não faça jamais como eu fiz.
Acenei para ele, num gesto afirmativo e saí.
[...]

Era uma sexta-feira e Ernani havia me pedido para acompanhar Aliel à inauguração de uma instituição beneficente, que ocorreria no Centro Espírita Paula e Estevão. Eu fora, é claro, com todo prazer. Tratava-se de uma organização irlandesa que estava fundando sua sede aqui no Ceará. Seu objetivo era trabalhar junto às escolas públicas de periferia, para fomentar a consciência política e criar pessoas politicamente alfabetizadas para inibir a compra de votos e ações análogas, por parte de políticos inescrupulosos. Ao sair por volta de dez da noite, um fato me chamou a atenção: um carro estava parado numa esquina e um homem servia sopa em diversos pratos descartáveis a uma porção de gente faminta. Eram jovens, crianças, velhos e envelhecidos. O fato em si não me era totalmente estranho, pois existem muitos registros de pessoas que praticam essa atividade de compaixão ao próximo necessitado. O que me despertou o interesse pela cena era seu protagonista: Pedro César. Era exatamente ele, o homem que, rico, menoscabara os amigos e até familiares; pobre, fora desprezado por todos e se arrependera. Peguei Aliel pelo braço e me aproximei do grupo. O homem, reconhecendo-me, falou em tom jocoso:
─ Vai dois pratos de sopa aí, meu?
─ Por que não? Se é dado com amor!
Ele riu e me estendeu, sob os olhares ciumentos dos famintos, dois pratos, um para mim outro para Aliel, que lutava por entender o que estava acontecendo. Depois de todos os “clientes” com os pratos nas mãos se afastarem para saborear a refeição, a qual para muitos era a única do dia, ele me apertou a mão e disse:
─ Pois é parceiro, a vida me deu uma nova chance.
E em poucas palavras me contou sobre os últimos acontecimentos de sua vida. Falou-me do emprego que havia conseguido, sua rápida ascensão, as economias que fizera, as privações pelas quais passara e a aposta ao montar uma pequena lanchonete, que logo se transformara numa rede de restaurantes. Agora estava bem, não apenas porque recuperara seu padrão financeiro de antes, mas porque recupera o carinho e a amizade daqueles que desdenhara. Contou-me com ar compungido que não tivera, ao visitar a terra natal, pudor de ir ter com os eis amigos, apertar-lhes a mão e lhes pedir desculpas. Falou-me também, sem grande alarde, sobre o que estava fazendo ali e de como isso o alegrava. Contou-me ainda que casara e tivera um filho agora com um ano de idade, a quem ensinaria todas as lições que aprendera a custo. Eu fiquei muito feliz e saí satisfeito em saber que a humanidade tem jeito. Naquela noite dormi tranqüilo e imaginando um mundo melhor em que todos tenham direito a ser felizes, um mundo em que as pessoas, numa imensa corrente, não permitam que ninguém passe privações tão básicas quanto o direito à alimentação. E que enfim a humanidade..

...Seja feliz!

O MILHO MUDA COM O FOGO. E VOCÊ?

O MILHO MUDA COM O FOGO. E VOCÊ?


O título original desse texto que me chegou às mãos era “A pipoca muda com o fogo”. Percebendo nisso certa incoerência, resolvemos fazer a mudança que se vê no novo título. Tomamos ainda a iniciativa de fazer algumas alterações, como colocar sempre o pronome ela/elas assim como o substantivo mulher/mulheres, para evitar o sexismo de linguagem verificado no original. Entretanto todos os méritos do texto cabem ao seu autor. Em nenhum momento nos passou pela cabeça que alguém venha a atribuir a nós sua autoria, tampouco seu ensinamento filosófico.


A transformação do milho duro em pipoca macia é símbolo da grande transformação por que devem passar os homens e as mulheres para que eles e elas venham a ser quem devem ser. O milho da pipoca não é o que deve ser. Ele deve ser aquilo que acontece depois do estouro. O milho da pipoca somos nós: duros, quebra-dentes, impróprios para comer. Pelo poder do fogo podemos, repentinamente, nos transformar em outra coisa. Mas a transformação só acontece pelo poder do fogo.
O milho da pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho de pipoca para sempre. Assim acontece com a gente. As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo. Quem não passa pelo fogo fica do mesmo jeito a vida inteira. São pessoas de uma mesmice e uma dureza assombrosas. Só que elas não percebem. Acham que o seu jeito de ser é o melhor jeito de ser. Mas de repente vem o fogo. O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos: DOR.
Pode ser fogo de fora: a perda do emprego, do grande amor, de um filho, do pai; uma doença, súbito estado de pobreza. Pode ser fogo de dentro: pânico, medo ansiedade, depressão ou sofrimento cujas causas ignoramos. Há sempre o recurso do remédio: apagar o fogo. Sem fogo o sofrimento diminui e com isso a possibilidade da grande transformação.
Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro ficando cada vez mais quente, pensa que sua hora chegou, vai morrer. Dentro de sua casca dura, fechada em si mesma. Ela não pode imaginar destino diferente. Não imagina a transformação que está sendo preparada. Ela não imagina aquilo de que é capaz. Aí, sem aviso prévio, pelo poder do fogo a grande transformação acontece: PUM! E ela aparece como uma outra coisa totalmente diferente que ela mesma nunca havia sonhado.
Bom mais ainda temos o milho de pipoca que se recusa a estourar. São aquelas pessoas que por mais que o fogo esquente se recusam a mudar. Elas acham que não pode existir coisa mais maravilhosa do que o jeito de elas serem. Sua presunção e o medo são a dura casca de milho que não estoura. O destino delas é triste. Ficarão duras a vida inteira. Não vão se transformar na flor branca e macia. Não vão dar alegria para ninguém.
Terminado o estouro alegre da pipoca, no fundo da panela ficam os milhos duros que não servem para nada. Seu destino é o lixo.



Que lição estupenda podemos aprender com o fenômeno da transformação do milho duro em pipoca! Para sermos felizes é preciso que deixemos que essas transformações nos ocorram, desde que sejam necessárias, pois há pessoas que já nascem macias como se sua transformação tivesse ocorrido antes de elas nascerem nesse plano terreno. É preciso que olhemos para nós, para as nossas atitudes diante da vida, para com os outros. Como está a nossa face: carregada, pesarosa? O que destilamos: tristeza, ódio, sofrimento? Para podermos mudar.

Entretanto não é preciso passar pelo fogo para que haja essa transformação. Não precisamos ficar desempregados, perdermos o pai ou ficarmos sem o grande amor para nos transformarmos em pipoca macia. Toda transformação passa por um período de clausura, como o que ocorre com as desajeitadas lagartas, que se metamorfoseiam em belas e elegantes borboletas. Há um provérbio do domínio público que diz “O homem inteligente aprende com os próprios erros, mas os sábios aprendem com os erros alheios.”, por isso não precisamos penar no vale de lágrimas do nosso inferno inconsciente para melhorarmos. Paremos um pouco, numa clausura momentânea. E façamos nosso casulo individual. Depois dessa meditação nós vamos nos avaliar e imaginarmos a avaliação que as outras pessoas fazem de nós e... ESTOUREMOS! como o milho de pipoca, com pouco treinamento seremos pessoas melhores mais felizes e que farão as outras também felizes. O mundo está cheio de energia quântica, que é aquela que não vemos, não tocamos. E essa energia existe de duas formas: negativa e positiva. Se somos negativos/as o mundo nos verá assim e nós só vamos contribuir para aumentar sua negatividade; se positivos contribuímos para que o mundo inteiro também o seja.
Enfim estouremos, sem fogo mesmo, desfaçamo-nos dessa casca dura que nos envolve e sejamos a macia pipoca que fará o bem às outras pessoas e, conseqüentemente, a nós mesmos e assim...


SEJAMOS FELIZES!

NA ESCURIDÃO MISERÁVEL

FERNANDO SABINO  “Eram sete horas da noite quando entrei no carro, ali no Jardim Botânico. Senti que alguém me observava, enquanto punha o m...