quinta-feira, 1 de maio de 2014

ÓPIO - AGOSTINHO NETO


Opio


Casaram-me COM Uma tristeza!



A minha terra negra de sol-a Minha Mãe-Opaco entoa melodias magoadas los Noites de festa quando um ea lua ri Enigmatica Floresta farfalha ritmos de jazz,-a Minha Mãe-DEU-me tristeza los Casamento quando nasci.










Localidade: Não tiva infância
NEM Mocidade
Localidade: Não tiva uma alegria
da Primeira idade
POR Causa dEste Noivado prematuro e senil.

MEUS Pesados ​​Dias São Ilusões
MEUS prazeres amarguras
a Felicidade ea Vida
Sonhos.

Eu proprio sou uma Ilusão
Sou uma irrealidade
sou Sonho.

O o Porque a Realidade E UMA tristeza
e UMA Localidade: Não Quero ASSIM

Para a esquecer
e olvidar Meus Amores
Os Meus ideias
Opio fumo.

Para a esquecer
e olvidar Meus Amores
Os Meus ideias
Opio fumo.

-Eu sensualizo a Vida:
o belo Brilho da Luz
Trabalho quando o sol
queimando OS ombros nus
gozo o sadismo do Fogo
quando Danço à fogueira
ea Lenha contorce
sofrendo
Como o Meu Sofrimento
amarfanha UMA alma.

Gozo
gozo ingenuamente
a fingir Que Localidade: Não sofro;
Como quem de choro de ri!

Fumo O Meu Opio
Para sonhar

COIMBRA 1947

sexta-feira, 21 de março de 2014

O QUE HÁ NUM BEIJO?



 

A letra da música, tema da novela Baila Comigo, indagava  “What’s in a kiss?”. Em tradução, deve-se ler “o que há num beijo?” ou “O que tem de mais num beijo?”.  Realmente, aparentemente não há nada de mais em uma bicota ou selinho, como queria a dinossáurica Hebe Camargo. Entretanto não é bem o que vemos nove meses após o fim do carnaval, regado a muita bebida e a muito “axé music”, com Ivete e Bel exagerando nas receitas de curtição:
“Quando você passa eu sinto seu cheiro
               Aguça meu faro e disparo em sua caça, iaiá
 (...)
Me abraça e me beija
                Me chama de meu amor
                Me abraça e deseja
               Vem mostrar pra mim o seu calor”


               
                Não vim aqui falar de beijos, tampouco de ivetes e bels. Mas é que observando algumas atitudes, aparentemente inofensivas, me lembrei da música de O’Sullivan e me arremeti aos temas carnavalescos e, por que não dizer, animalescos. Recentemente estava numa fila de um desses postos da Caixa espalhados pelo país, nas casas lotéricas, quando vi uma senhora se aproximar de outra que estava bem encaminhada e solicitar-lhe que  lhe pagasse as contas. A outra sem nenhuma cerimônia aceitou a missão. E as pessoas que estavam na fila também não se importaram. Uma moça na minha frente fez, silenciosa, um comentário de desagravo. Ao que eu retruquei que ela, a senhora-fura-fila, não tinha nenhuma noção do que estava fazendo. Ela simplesmente acha normal. Não vê ali nenhuma transgressão à ética social.
E continuei com minhas reflexões, enquanto presenciava  mais uma ocorrência do gênero. Desta feita uma senhora antes de adentrar o supermercado, colado a essa agência,  deixou a mãe, possivelmente octogenária, caquética, na fila preferencial. Quando voltou, assumiu o lugar da velhinha, deixando-a confortavelmente sentada num banco de madeira, do lado de fora. Quando estava na boca do caixa, chamou a mãe para não ser contrária aos bons procedimentos. Ouvi alguns outros comentários contra aquela filha desalmada, mas só quando a mesma se retirou. Desta vez fiquei calado.
Mas a surpresa maior estava por vir. Depois de quarenta minutos de fila, sem nenhum estresse, pois acho a fila a única instituição realmente democrática, pois, mais do que a morte, ela nos nivela, sem nenhuma discriminação, não obstante essa democracia ser constantemente vilipendiada, como a outra, a falsa. Pois bem, após quarenta minutos, estou eu na boca do caixa. E foi aí que me veio a maior decepção que um educador pode ter. Uma colega de profissão, supostamente minha amiga, aparece-me como um fantasma, com as mãos cheias de contas, após um longo suspiro me, entrega a carga, ou melhor, tenta me entregar dizendo “que bom encontrar você aqui”. Dei uma rápida olhada para trás, vi que a fila estava bem maior do que quando cheguei, olhei-a meio atordoado, mas tive coragem e lhe disse “vamos respeitar as pessoas que estão na fila”. A mesma ficou lívida, sua face quase se afoga num esgar de surpresa. Virou o rosto e sem se despedir, foi para o final da fila, sem me deixar externar a única saída para a situação que era oferecer-lhe o meu lugar.
Próximo ao condomínio onde moro há uma padaria a qual frequento esporadicamente. Sempre que lá me encontro, sempre pela manhã, vejo policiais do (quase extinto) Ronda do quarteirão merendando uma merenda nada frugal. Após o lanchinho eles saem sem pagar. Qualquer um infeliz que por ventura esteja lendo esta crônica, com certeza, já deve ter presenciado cenas desse tipo em padarias, lanchonetes, churrascarias, restaurantes. Os donos dos estabelecimentos não reclamam, pois recebem uma “proteçãozinha” extra. Certa vez em um supermercado, vi um cidadão, com o perdão da palavra, tomando calmamente uma cerveja no interior do estabelecimento. Nada de mais, pois muitos o fazem, e os gerentes também não se importam. É uma forma de manter o cliente no interior da loja por mais tempo.  O caso é que o homem se dirigiu ao balcão de frios, pediu uma fatia de presunto para provar. Após saboreá-lo, deixou discretamente o vasilhame de cerveja, vazio, sobre embalagens de salsichas e saiu tranquilamente. Ele deve ter pensado consigo: “como eu sou esperto, bebi e ainda tirei o gosto”, e deve ter ajuntado a esse pensamento o seguinte: “os supermercados são ricos, tiram de nós, mas eu tiro deles”. Santa ignorância, Batman!
Sei que todos sabem, mas eu vou lembrar: todas essas atitudes são atos de corrupção, tão graves quanto desviar 40 milhões de dólares da Previdência Social, como pagar aos deputados para que esses beneficiem o governo.   Então não adianta sairmos por aí falando mal dos políticos, das autoridades corruptas, que nos envergonham com mensalões e mensalinhos, se praticamos os mesmos atos que corrompem a ética de convivência. Que país estamos querendo construir, que cidadãos queremos formar em nossos alunos e em nossos filhos? Acho que essa deveria ser a pergunta que devemos fazer antes de furar uma fila, comer um bombom escondido em um supermercado ou desviarmos a verba da merenda escolar.

(Professor Alves, março de 2014) 

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

ATÉ BREVE!




Quando o moço do socorro, depois de examinar lhe o homem, virou-se e, atabalhoadamente, perguntou se ela tinha plano funerário, a vista escureceu de tal forma que ela teve de se segurar para não desabar. O moço então lhe repetiu a pergunta. Ela interrogou-me com os olhos “como assim, plano funerário, pra que eu quero um plano funerário?” Respondi ao moço o que ele queria ouvir. Em seguida pus a mão em seu ombro e percebi lhe certa vertigem. Para minha surpresa, depois que o socorro se retirou, ela se dirigiu à cozinha, pegou um pano molhado e pôs-se a esfregar o chão. Não pude ler seus pensamentos, mas entrevi uma preocupação: “ele vai despertar e não vai gostar de ver o chão sujo”. Em seguida estrondou-se em uma gargalhada como lhe era habitual. Deve ter pensado “mas ele nunca exigiu nada, era eu quem mandava nele” e entoou baixinho “sim senhora”. Era esse o bordão que ele sempre usava. Ao que se virou para mim e disse: “ah! meu amigo, não posso acreditar”.
Estávamos só nós dois. Ela me acordara cedo, aos gritos de “meu homem está morrendo”, Saí estonteado, correndo. Ainda o vi com a última respiração em progresso. A última! Liguei para o socorro que constatou o óbvio, o qual  os seres humanos séculos após séculos ainda teimam em não aceitar. Sentei-me entristecido, olhando aquela mulher encanecida, sem filhos, sem ninguém. Agora ela estava sem ninguém. O companheiro de sempre, de todos os dias, de todas as horas, de todos os minutos, de todas as brigas havia desencarnado. Jazia agora o corpo, o qual ela espera de súbito levantar-se e dizer “sim senhora”, mesmo de brincadeira. Eu me postara sem pensar. Olhando o vazio. No fundo eu também esperava vê-lo  se levantar e dizer “sim senhor” e rir-se diante da pilhéria, como era seu costume.
Quando o gato entrou, percebeu, pelo seu instinto, algo errado. Percebi que farejava o ar. Levantou as orelhas, como a escutar o inaudito. Em seguida, embarafustou-se para a cozinha, em busca de algo para comer. Ela riu e foi cuidar do gato. Estava demorando a presença de mais pessoas. Só a minha e a dela não bastavam. Eu tinha dado dois ou três telefonemas. Quando o gato já ia saindo, olhando de través  e lambendo os beiços, é que começaram a chegar as primeiras caras. Familiares, amigos, curiosos, que não acreditam na morte e precisam vê-la para nela crerem. Alguém trouxe café, outros chegavam com bolachas, pães, torradas. Enquanto se conversava na sala, assuntos de mortes, histórias semelhantes, outras nem tanto, observei que ela adentrara o quarto e trancara a porta. Pela fresta da imaginação, pude vê-la num último adeus ao companheiro de todas as noites. A mão tocando-lhe o corpo inerte, acariciando lhe a barba tantas  vezes afagada, outras tantas beijada. Pude sentir sua pressão subir, abraçando o corpo de todos os tempos, de todas as glórias, a boca entreaberta para o último beijo. O homem ainda estava ali. Era preciso possuí-lo rapidamente antes eu alguém pudesse interromper...
No velório estávamos na mesma posição. Era como se nada tivesse mudado, como se não tivesse tomado banho, trocado de roupa. Os olhos fitos no vazio, buscando uma explicação para o que já não precisa ser explicado. Aliás para o que nunca necessitou de explicação. Ela, de negro, acariciava o homem, antes que nada mais houvesse, antes que nada mais sentisse, antes que a vida perdesse o sentido. Até a hora estrema em que os estremos se unem finalmente.  O que é pó finalmente volte ao pó, e o que é espírito se encaminhe para os iguais.
Não houve choros, não houve cenas. Apenas o corpo descendo à terra, cercado de madeira, envolto na escura mortalha, como se não bastasse a escuridão do túmulo. Em determinado momento, não sei por quê, meus olhos buscaram os dela. E li neles uma promessa. Não uma promessa de vida, não uma promessa de carne. Mas uma promessa de almas. “Até breve, meu homem. Não saberei viver o resto de minha velhice sem os nossos dias, sem as nossas brigas, sem as nossas risadas, sem os nossos porquês. Até breve, meu amigo, a única coisa que me enlaçava à dor vivente, não está mais comigo. Não te afastes de mim, não vá muito longe. Em  breve, estaremos juntos novamente... e aí você vai me explicar a história daquele telefonema misterioso”.

(Professor Alves, janeiro de 2014)

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

SE TODAS AS MULHERES FOSSEM RESOLVIDAS COMO A DA HISTORINHA ABAIXO, CHAUVINISTAS COMO O SR. ALAN III NÃO PRATICARIAM ATROCIDADES COMO A DE DOMINGO.


Era uma vez... numa terra muito distante...uma princesa linda, independente e cheia de autoestima.
            Ela se deparou com uma rã, enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo era relaxante e ecológico...
          Então, a rã pulou para o seu colo e disse: linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito. Uma bruxa má lançou-me um encanto e transformei-me nesta rã asquerosa.  Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo príncipe e poderemos casar e constituir lar feliz no teu lindo castelo.  A tua mãe poderia vir morar conosco, e tu poderias preparar o meu jantar, lavar as minhas roupas, criar os nossos filhos e seríamos felizes para sempre...
          Naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, a princesa sorria, pensando consigo mesma:
          - Eu, hein?... nem morta!
Luis Fernando Veríssimo

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR QUE LÊ


  
Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedra?
E a Babilônia várias vezes destruída —
Quem a reconstruiu tantas vezes? Em que casas
Da Lima dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros, na noite em que a Muralha da China ficou pronta?
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo.
Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Césares? A decantada Bizâncio
Tinha somente palácios para seus habitantes? Mesmo na lendária Atlântida
Os que se afogavam gritaram por seus escravos Na noite em que o mar a tragou.

O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?
César bateu os gauleses.
Não levava sequer um cozinheiro?
Filipe da Espanha chorou, quando sua Armada
Naufragou. Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu além dele?

Cada página uma vitória.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande homem.
Quem pagava a conta?

Tantas histórias.
Tantas questões.

BERTOLD BRECHT