Trata-se de textos escritos a partir de experiências com pessoas, jovens e/ou adultas, para levar à reflexão sobre alguns aspectos da vida, como política, literatura, História, Felicidade. DEIXE UM COMENTÁRIO
sexta-feira, 8 de junho de 2012
segunda-feira, 28 de maio de 2012
O MELHOR DO SONHO
O melhor do
sonho não foi quando menino Jesus tocou-me o braço
Me olhou nos
olhos e me segredou sobre o paraíso
O melhor do
sonho não foi quando avistei as naus que vinham em visita
Trazer novas
do velho mundo e construir um mundo novo
O melhor do
sonho não foi quando retornado ao imponente mundo grego
Vi Milo
carregando às costas, em exercício, um touro fabuloso
O melhor do
sonho não foi quando chorei de alegria
Ao ouvir Jessier
Quirino e seu Bolero de Isabel
O melhor do
sonho não foi quando tremi ao ouvir cascos potentes
Dos cavalos
de Átila e dos hunos com suas narinas famélicas de aventuras
O melhor do
sonho não foi ver as pernas tortas de Garrincha
E acordar
assistindo a um gol de Neymar
O melhor do
sonho não foi me ver já velho, moribundo
Excitado
pela possibilidade do mistério
O melhor do sonho
não foi entrar na tela de cinema
Assistir ao
vivo o cheiro de sangue dos Jogos Mortais
O melhor do
sonho não foi ver Madre Tereza sorrindo
limpando-me,
as feridas e amenizando a fome
Tudo isso foi
maravilhoso, fantástico
Mas o melhor
do sonho foi quando me vi adolescente
Assistindo
ao maior espetáculo da terra: teu sorriso.
(Professor
Alves)
domingo, 27 de maio de 2012
QUANDO MEU PAI MORREU
Quando cheguei
à casa de meu pai e o vi morto, eu sorri
Porque sei
que era exatamente o que ele faria se se visse morto
Ele estava
lindo, morto
Como sempre
fora
O rosto
rígido
A boca
entreaberta, como se quisesse desafiar num grande sorriso
As pessoas
sofriam, choravam
Ele se ria
de tamanha ingenuidade
E se pudesse,
diria com voz firme como sempre falara:
“Assim é a vida
Assim é a
morte
Não estamos
aqui para semente
Caminhamos
eu e a vida inteira de braços e mãos dadas
Agora é
momento de visitar a morte, o mistério
Passei a
vida toda nos desenganos da vida
Quero ver os
desacertos da morte
Se a vida me
fez feliz ou triste
Se tive
amores e traições se traí e amei em vida
Na morte
quero, se me for possível, amar, ser alegre e triste
Não fui
homem de fugir das agruras que a vida impunha
Serei
espírito de temer o que me espera?
Não, e parem
de chorar! cantem-me os parabéns
Não é com
choro que se enterra um homem
É com
aplausos que se vê a ascensão de um espírito!”
Quando o guardaram naquela urna escura
Pensei que fosse desabar
Parecia-me que as lágrimas guardadas fossem desaguar
Mas senti de súbito um alívio
Meu pai não estaria mais ali, nem aqui, nem acolá
Seu Luís iria finalmente descansar
Depois de 86 anos de lida
Desde pequenino
Imagino o filme de que ele foi personagem
Nossa quanta traquinagem
Nossa quanta brincadeira
Nossa quanta tristeza
Nossa quanta alegria
Quanta noite quantos dias
Finalmente descansou
Meu pai
Meu espelho
Meu orgulho
E espero que quando chegar a minha vez
Meu filho não chore
Apenas tenha carinho pelo que fiz e pelo que me espera
(Professor
Alves)
POEMA DO MENINO JESUS
Num meio-dia de fim de Primavera Tive um sonho como uma fotografia. Vi Jesus Cristo descer à terra. Veio pela encosta de um monte Tornado outra vez menino, A correr e a rolar-se pela erva E a arrancar flores para as deitar fora E a rir de modo a ouvir-se de longe. Tinha fugido do céu. Era nosso demais para fingir De segunda pessoa da Trindade. No céu tudo era falso, tudo em desacordo Com flores e árvores e pedras. No céu tinha que estar sempre sério E de vez em quando de se tornar outra vez homem E subir para a cruz, e estar sempre a morrer Com uma coroa toda à roda de espinhos E os pés espetados por um prego com cabeça, E até com um trapo à roda da cintura Como os pretos nas ilustrações. Nem sequer o deixavam ter pai e mãe Como as outras crianças. O seu pai era duas pessoas - Um velho chamado José, que era carpinteiro, E que não era pai dele; E o outro pai era uma pomba estúpida, A única pomba feia do mundo Porque nem era do mundo nem era pomba. E a sua mãe não tinha amado antes de o ter. Não era mulher: era uma mala Em que ele tinha vindo do céu. E queriam que ele, que só nascera da mãe, E que nunca tivera pai para amar com respeito, Pregasse a bondade e a justiça! Um dia que Deus estava a dormir E o Espírito Santo andava a voar, Ele foi à caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido. Com o segundo criou-se eternamente humano e menino. Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz E deixou-o pregado na cruz que há no céu E serve de modelo às outras. Depois fugiu para o Sol E desceu no primeiro raio que apanhou. Hoje vive na minha aldeia comigo. É uma criança bonita de riso e natural. Limpa o nariz ao braço direito, Chapinha nas poças de água, Colhe as flores e gosta delas e esquece-as. Atira pedras aos burros, Rouba a fruta dos pomares E foge a chorar e a gritar dos cães. E, porque sabe que elas não gostam E que toda a gente acha graça, Corre atrás das raparigas Que vão em ranchos pelas estradas Com as bilhas às cabeças E levanta-lhes as saias. A mim ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas Quando a gente as tem na mão E olha devagar para elas. Diz-me muito mal de Deus. Diz que ele é um velho estúpido e doente, Sempre a escarrar para o chão E a dizer indecências. A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia. E o Espírito Santo coça-se com o bico E empoleira-se nas cadeiras e suja-as. Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica. Diz-me que Deus não percebe nada Das coisas que criou - "Se é que ele as criou, do que duvido." - Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória, "Mas os seres não cantam nada. Se cantassem seriam cantores. Os seres existem e mais nada, E por isso se chamam seres." E depois, cansado de dizer mal de Deus, O Menino Jesus adormece nos meus braços E eu levo-o ao colo para casa. Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro. Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava. Ele é o humano que é natural. Ele é o divino que sorri e que brinca. E por isso é que eu sei com toda a certeza Que ele é o Menino Jesus verdadeiro. E a criança tão humana que é divina É esta minha quotidiana vida de poeta, E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre. E que o meu mínimo olhar Me enche de sensação, E o mais pequeno som, seja do que for, Parece falar comigo. A Criança Nova que habita onde vivo Dá-me uma mão a mim E outra a tudo que existe E assim vamos os três pelo caminho que houver, Saltando e cantando e rindo E gozando o nosso segredo comum Que é saber por toda a parte Que não há mistério no mundo E que tudo vale a pena. A Criança Eterna acompanha-me sempre. A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado. O meu ouvido atento alegremente a todos os sons São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas. Damo-nos tão bem um com o outro Na companhia de tudo Que nunca pensamos um no outro, Mas vivemos juntos e dois Com um acordo íntimo Como a mão direita e a esquerda. Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas No degrau da porta de casa, Graves como convém a um deus e a um poeta, E como se cada pedra Fosse todo o universo E fosse por isso um grande perigo para ela Deixá-la cair no chão. Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens E ele sorri porque tudo é incrível. Ri dos reis e dos que não são reis, E tem pena de ouvir falar das guerras, E dos comércios, e dos navios Que ficam fumo no ar dos altos mares. Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade Que uma flor tem ao florescer E que anda com a luz do Sol A variar os montes e os vales E a fazer doer aos olhos dos muros caiados. Depois ele adormece e eu deito-o. Levo-o ao colo para dentro de casa E deito-o, despindo-o lentamente E como seguindo um ritual muito limpo E todo materno até ele estar nu. Ele dorme dentro da minha alma E às vezes acorda de noite E brinca com os meus sonhos. Vira uns de pernas para o ar, Põe uns em cima dos outros E bate palmas sozinho Sorrindo para o meu sono. Quando eu morrer, filhinho, Seja eu a criança, o mais pequeno. Pega-me tu ao colo E leva-me para dentro da tua casa. Despe o meu ser cansado e humano E deita-me na tua cama. E conta-me histórias, caso eu acorde, Para eu tornar a adormecer. E dá-me sonhos teus para eu brincar Até que nasça qualquer dia Que tu sabes qual é. Esta é a história do meu Menino Jesus. Por que razão que se perceba Não há-de ser ela mais verdadeira Que tudo quanto os filósofos pensam E tudo quanto as religiões ensinam ? Alberto Caeiro
sábado, 26 de maio de 2012
TU
Sou apenas eu
Mero ser sem fantasia
Sem buraco negro
Sem teogonia.
Mas de repente Tu me
arrebatas
eu, do mundo dos vivos,
Transcendo ao dos
imortais
Sou feliz, amante, Teu,
todo Teu.
Mas Tu me me dizes não
E me devolves insano
Sou novamente pobre,
reles mortal
Sem Ti não sou nada
além de mim mesmo.
Sofro, respiro, rezo
A oração me guia
Me leva a um só
caminho
A solidão me pega, me
domina.
De súbito estou
sóbrio, até rio
Mesmo sendo apenas eu
Mortal sem signo, sem
salvação
mesmo sem Ti.
Mas de repente Tu me
arrebatas
…
(Professor Alves,
18/11/11)
sexta-feira, 11 de maio de 2012
PARA TODAS AS MÃES DO MUNDO E DO CÉU
Para Sempre
Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.
Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.
(Por Carlos Drumond de Andrade)
quinta-feira, 10 de maio de 2012
A HUMANIDADE E SUAS DIFERENÇAS
Grandes homens falam palavras de muita sapiência. Isso todo mundo sabe.
Os livros e páginas da internet estão repletos deles e delas. E mesmo a nossa
memória não deixa que alguns ditos fantásticos se percam com o tempo. Lembro-me
de muitas dessas pérolas. A que mais me é recorrente é uma de machado de Assis,
presente no romance Quincas Borba. Escrevo-a à guisa de exemplo: “Para que
servem os calos, senão para aumentar a felicidade dos pedestres!”
Mas mesmos grandes homens e mulheres dizem um tanto de besteiras, de vez
em quando, sem querer ou mesmo querendo, impulsionados por momentos de paixão,
em que a razão pede para descansar, deixa o cérebro hibernando, enquanto o
coração toma as rédeas dos atos e da boca e da pena. Só isso justificaria os
versos de Vinícius de Morais:
“Se todos fossem no mundo iguais a
você
Imaginem todos
no mundo iguais à musa do Poetinha (que de inho não tinha nada)! Por mais
linda, por mais faceira, por mais gentil que ela fosse seriam desnecessários
todos esses adjetivos.
O que faz o mundo saboroso de viver, instigante, atraente; o que torna a
vida, mesmo amarga, cheia de percalços, mesmo com suas desigualdades, preferida
à morte são as diferenças de todos os naipes. Há pessoas que sonham com um
mundo de igualdades. Mas é como se vivêssemos em preto e branco, viver seria sensabor,
inodoro. É o arco íris humano que torna de fato o estar aqui, respirando sobre
a terra, maravilhoso. Deixemos que as pessoas sejam loiras e negras, morenas e
pardas, altas e baixas, magras e gordas, belas e nem tanto. Vá que a humanidade
seja abastada e paupérrima, triste e feliz, crente e ateia. É o desafio de
minorar o sofrimento, a tristeza, a pobreza que dignifica o viver, enobrece a
luta, pois, se todos fossem iguais a mim ou a você, viver não teria nenhuma graça.
(Professor Alves, 05/2012)
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