(V
poema do livro O Guardador de Rebanhos, de Fernando Pessoa pelo heterônimo
Alberto Caeiro)
Vamos iniciar
nossa reflexão de hoje pelo trecho “mas ela não tem cortinas”. Aqui ele
completa a sequência de versos
“Para mim pensar nisso é fechar os
olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da
minha janela (mas ela não tem cortinas).”
E
por que sua janela não tem cortinas? A resposta é simples. Caeiro é o poeta
da natureza. Vive para admirar a natureza e só nela refletir. Se pusesse
cortinas em suas janelas, como iria observar a natureza, como iria admirar os
pores do sol, as árvores a chuva. Aí reside toda sua metafísica, ou
antimetafísica, como querem alguns estudiosos, como Antônio Afonso Borregana e Bárbara
Ferraz, ambos professores de português em Portugal.
Assim
ele nega a existência daquilo que seus olhos, sentido primordial para Caeiro,
não podem alcançar. Logo ele não acredita em Deus porque:
“Se ele quisesse que eu acreditasse
nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me,
Aqui estou!”
Agora se Deus for
as árvores, a chuva e tudo o mais que seus olhos e seus outros sentidos possam
alcançar, então a crença em Deus passará a fazer parte de sua pessoa. Porque
sua simplicidade de guardador de rebanhos, mesmo nunca os tendo guardado (ver
poema I) não permite que acredite no mistério. Não há mistério. O único mistério
real é não haver mistério algum. Se alguém fechar os olhos deixará de ver o
sol, e o sol vale mais do mil pensamentos. Então para que pensar? Aí reside
toda a objetividade da poesia de Caeiro, reside toda sua simplicidade. Tudo na
vida é simples. Quando pensamos no porquê ou no “sentido íntimos das coisas”
estamos destruindo sua real beleza por que o grande mérito da existência das
coisas é “elas não terem sentido íntimo nenhum”. O poeta após refletir sobre a
existência/inexistência de Deus ele nos remete a uma visão panteísta do mundo.
Logo, se Deus existe ou Deus é tudo que
está na natureza, eis então a desnecessidade das religiões, porque assim a vida
do poeta
“é toda uma oração e uma missa,
E
uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos”
Aí
está onde reside toda a poesia e toda a vida do poeta: ver, ouvir sentir
através do tato ou do olfato toda a natureza, que representa a simplicidade a
objetividade. Toda a metafísica do poeta resume-se em uma profissão de fé, que
é a crença na existência de Deus porque ele se mostra a ele durante todos os
momentos:
“E chamo-lhe luar e sol e flores e
árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E
ando com ele a toda a hora”.
(Professor
Francisco Alves)
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