terça-feira, 29 de agosto de 2017

POETAS NORTE-RIO-GRANDENSES



POETAS NORTE-RIO-GRANDENSES

·         Lourival Açucena: Pseudônimo de Joaquim eduwirges de Melo Açucena, nasceu em 1827 e faleceu em 1907, conhecido como culturalmente eclético, Lourival cantava, representava, declamava e tocavam instrumentos. É um dos poetas da fase pós romântica, assim descrito por Câmara cascudo: “Homem do século XIX, durante sessenta anos dominou as serenatas, as festas e as ceias íntimas de natal”. Teve sua obra publicada apenas em 1927, por Luiz da Câmara Cascudo. Sua poesia não possuía uma temática ou estilo únicos, embora se perceba uma penetração no universo árcade.

Soneto
sob o mote: hei de mártir de amor, morrer te amando.

Inda cabe rigor neste teu peito?!
Anália, de afligir-me inda não cansas?!
Cruel, não sentes, ímpia, não alcanças
De tua ingratidão o triste efeito?!

Teu duro coração já satisfeito
Acaso não estará dessas provanças
Que me dão caprichosas esquivanças,
Com que pisas de amor doce preceito?!

Entre surdos arquejos de agonia
Vou a Vida de angústias acabando,
Que um ai! Um só sorriso salvaria.

Mas, embora ferina vais matando
Meu firme coração com tirania,
"Ei de mártir de amor, morrer te amando."
(Lourival Açucena)

·         Auta de Sousa nasceu em 1876 e faleceu em 1901. Vivendo apenas 25 anos incompletos,  é considerada a principal poetisa romântica-simbolista do Rio Grande do Norte. Sua poesia, lírico-religiosa por natureza traz na sua essência as tragédias que marcaram a vida da poetisa: morte do pai e da mãe, pela mesma doença que a levaria, a morte do irmão mais novo em um incêndio e a morte do ex-namorado, de quem fora afastada para cuidar da saúde, além da sua vivência religiosa na escola onde estudara. Sua obra foi compilada no livro Horto, levado pelo irmão Henrique Castriciano  para o crivo de Olavo Bilac, que o prefaciou. Vejamos neste fragmento que segue a espiritualidade aflorada de Auta de Sousa

HORTO (fragmento)

 “ Oro de joelhos, Senhor, na terra  
Purificada pelo teu pranto ... 
Minh’alma triste que a dor aterra  
Beija os teus passos, Cordeiro Santo! 

Eu tenho medo de tanto horror ... 
Reza comigo, doce Senhor! 
Que noite negra, cheia de sombras. 
Não foi a noite que aqui passaste? 

Ó noite imensa ... porque me assombras.  
Tu que nas trevas me sepultaste? 
Jesus amado, reza comigo ... 
Afasta a noite, divino amigo! ” 

Eu disse ... e as sombras se dissiparam. 
Jesus descia sobre o meu Horto ...  
Estrelas lindas no céu brilharam,  
Voltou-me o riso, já quase morto. 

E a sua boca falou tão doce, 
Como se a corda de um’harpa fosse: 
“Filha adorava que o teu gemido  
Ergueste n’asa de uma oração, 

Na treva escura sempre envolvido,  
Por que soluça teu coração? 
Levanta os olhos para o meu rosto,  
Que a vista d’ele foge o desgosto. 
  
Não tenhas medo do sofrimento,  
Ele é a escada do paraíso ... 
Contempla os astros do firmamento, 
Doces reflexos de meu sorriso. 

(...)
(http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/rio_grande_norte/auta_de_souza.html)


·         Henrique Castriciano (1874 – 1947), irmão de Auta  de Sousa, considerado simbolista pela sua poesia plena de espiritualidade, nas lides parnasianas, produzindo sonetos bem metrificados, como Cruz e Sousa, esvai sua obsessão pela cor branca. Alguns de seus versos nos fazem lembrar seu contemporâneo Augusto dos Anjos, principalmente os versos de Monólogo de um bisturi.

MONOLOGO DE UM BISTURI 
« Primeiro o coração. Rasguemol-o. Supponho
Que esta mulher amou : tudo está indicando
Que morreu por alguém este ser miserando,
Mixto de Treva e Sol, de Maldade e de Sonho

Isso não me coinmove : adiante! Risonho
Fere, nevado gume! e ferindo e cortando,
Aço, mostra que tudo é lama e nada, quando
Sobre os homens desaba o Destino medonho...

Fere este braço grego! E as pomas cor de neve!
E as linhas senhoris que a penna não descrevei
Ë as delicadas mãos que o pó vae dissolver!

Mas poupa o ventre nu, onde um feto gerou-se
Porque hás de macular o somno casto e doce
Desse verme feliz que morreu sem nascer?”
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/rio_grande_norte/henrique_castriciano.html

·         Ferreira Itajubá tinha como nome de batismo  Manuel Virgílio Ferreira, (Natal, 21 de Agosto de 1876 – Rio de Janeiro, 30 de Junho de 1912) Sua poesia era ligada ao Romantismo, mas com influência do Parnasianismo e do Simbolismo. É emblemático do seu estilo estes versos de No Campo Santo, composto em homenagem póstuma ao seu contemporâneo Lourival Assucena:
Morreste e não soubeste, ó grande veterano,
Que, quando por Natal, a rosa todo ano
Floresce alegremente, entre as demais roseiras,
O prado embalsamando, ao lado das primeiras,
Esta alma não rebenta em rosas de ilusão
Como quando cantaste ao som do violão.

·         Jorge Fernandes (1887 a 1953) é outro poeta prefaciado por Câmara Cascudo em 1927, que, à maneira de Lourival Açucena não se enquadra em nenhuma escola ou estilo. Porém seu estilo pode ser identificado como poesia de tensão, em que se tem a impressão de que há um eterno embate que se renova a cada poema, como afirmou Câmara Cascudo. Essa tensão bem representa a convulsão intelectual que se espalhava pelo Brasil, o que confere a Fernandes o pioneirismo do Modernismo no Rio Grande do Norte. Entretanto sua poesia está plena de elementos telúricos, bucólicos e até inserções  na poesia concreta, de que é exemplo o poema Rede.

                       REDE
                   Emboladora do sono...
                   Balanço dos alpendres e dos ranchos...
                   Vai e vem nas modinhas langorosas...
                   Vai e vem de embalos e canções...
                   Professora de violões...
                   Tipóia dos amores clandestinos...
                   Grande...  larga e forte...  pra casais...
                   Berço de grande raça.

 S                                  A
U                        S
S               N
P       E


Guardadora de sonhos
Pra madona ao meio-dia
Grande... côncava...
Lá no fundo dorme um bichinho...
—  Balança o punho da rede pro menino dormir.
(http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/rio_grande_norte/jorge_fernandes.html)

·         José Bezerra Gomes (1911 – 1982) é outro nome festejado na Literatura rio grandense, e dado, por Moacir Cirne, poeta e crítico literário daquele estado,  como sequenciador, nos anos 40 e 50, dos trabalhos poéticos no século vinte iniciados por Jorge Fernandes. Poeta de síntese, é reconhecido por sua objetividade à Oswald de Andrade. Segundo o  crítico mencionado Moacir Cirne. Como o poema DIÁLOGO “José/Maria”.

CIRCO

Hoje  Hoje
grande
estréia
do grande
Circo
Tom Mix

Adiado o
espetáculo...

O palhaço
fugiu...

Aviso ao
público...     (http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/rio_grande_norte/jose_bezerra.html)

·         Zilá Mamede (1928 – 1985), poetisa professora e crítica literária, segundo ainda Moacir Cirne é a grande representante na década de sessenta, com seu livro O Arado. Com sua poesia de lirismo tímido mas às vezes caminhando em direção ao social, como em Procissão, gostava de invenções linguísticas, como SSMOS, presente no citado poema.  Foi bastante festejada por Carlos Drumond, que afirmou, de modo ufanista, que em sua geração “ninguém fez nada tão importante quanto Zilá Mamede”.

ARADO

Arado cultivadeira
rompe veios, morde chão
Ai uns olhos afiados
rasgando meu coração.
 
Arado dentes enxadas
Lavancando capoeiras
Mil prometimentos, juras
Faladas, reverdadeiras?
 
Arado ara picoteira
sega relha amanhamento,
me desata desse amor
ternura torturamento.
(http://www.antoniomiranda.com.br/brasilsempre/zila_mamede.html)


·         Moacy da Costa Cirne (São José do Seridó, 1943Natal, 11 de janeiro de 2014) foi um poeta, teórico da poesia, artista visual, iniciou em 1967 o movimento que ficou conhecido como Poema Processo, que buscou revolucionar o conceito de poesia, casando, não só a palavra com a imagem como queriam os concretistas, mas colocando a imagem acima da palavra.


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quinta-feira, 27 de julho de 2017

FESTEJOS DE INDEPENDÊNCIA, 2017




                Mais uma vez, estivemos na cidade de Independência durante os festejos da padroeira, Nossa Senhora Santana. Mais uma vez queria agradecer a receptividade daqueles que nasceram na simpática Porronca para com este, que só teve o prazer de adotar essa calorosa cidade, no sentido de afetuosa, como sua terra natal.
                Mais uma vez estivemos percorrendo as ruas da cidade e visitando os amigos aí feitos, assim como percorrendo os bares aí existentes. Mais uma vez visitamos o parque de diversões, que só se arma durante esses festejos, com seus brinquedos que nunca suprem os anseios infantis; nem saturam os olhos enamorados, ou os olhos de quem busca um companheiro. Não estou mais nessa idade. Minha ida ao parque tem o intuito de futurar algum nas muitas mesas de dado, brincadeira que já realizo há alguns anos.
                Mais uma vez fizemos da Seresta nosso refúgio noturno. Como sempre fugimos das festas dos clubes, momento em que as mulheres vão exibir seus “looks”, enquanto os homens as carteiras, pagando a dose de uísque a vinte ou trinta reais. Mas infelizmente, neste ano, tivemos uma surpresa desagradável. Os cantores, responsáveis por alegrar as noites durante a realização das serestas, não eram os mesmos, e quando o eram, suas escolhas musicais foram muito infelizes. Tratava-se de músicas de duplo sentido deplorável, ou mesmo sem esse recurso, letras que  vão direto ao ponto, para chegar a lugar nenhum. Triste ouvir no adro de uma igreja, com a aquiescência do pároco, durante os festejos religiosos, uma música cuja letra afirma que o amante (eu-lírico, ou melhor eu-ridículo) vai transformar a amante (casada) em laranja e chupá-la todinha. Sei que alguém (se é que alguém vai ler esse texto) vai dizer, “mas poeta, é assim mesmo, as coisas mudam”. Eu rio previamente e respondo que não. A educação, que transforma pessoas ignorantes em ouvidos sensíveis, não muda. O problema é a falta dessa educação engrandecedora. Por isso cito, pela milésima vez só esse ano, que a falta da boa Literatura e da boa música, consequentemente, mutila nossa humanidade. E mais, me envergonhei ao comparecer à Seresta,  em 2017, ambiente único em que nos anos anteriores me sentia bem à noite. Lembro-me das canções que até pouco tempo ouvíamos. Eram composições telúricas ou romanticamente sadias, longe desses gemidos libidinosos, que hoje alguns teimam em chamar música.
                Mas queria fazer uma ressalva. Na última noite, tivemos a grata surpresa de termos no palco Sílvio Holanda. Que presente! Pudemos ouvir, depois de sete noites, um profissional realmente comprometido com seu público, para realizar o que ele mesmo denominou “seresta autêntica”. Antes, dedicou seu xou (“Sílvio Holanda é xou”) a dois amigos desencarnados recentemente. Pagou os dissabores dos dias anteriores, mas não desfez a má impressão que ficou das noites que antecederam. Vou pensar, com certeza, duas vezes antes de ir a Independência  em 2018.

domingo, 25 de junho de 2017

INFÂNCIA





Hoje me encontrei em sono
Com o armário dos meus sonhos de infância!
Quem nunca os teve não foi criança.

O meu era azul, da cor do céu
E lá ficavam,
Entre pratos de ágata, copos de alumínio,
Meus brinquedos que nunca tive
A Caloi que meu pai nunca esqueceu
O ferrorama, e seu primo o autorama,
Do Fittipaldi, com suas curvas incríveis
O incrível Falcon, herói de verdade,
E o inesquecível Atari, pai de todos os games,
Forte Apache, o boneco Topo Gigio,
Além das bolas de couro, da seleção!

Em outros compartimentos
Junto das panelas amassadas,
Caçarolas enferrujadas,
Tampas já sem cabo,
Os brinquedos inesquecíveis que tive:
Meu pião, cheio de quiladas,
Minhas bilas cascabulhas,
Meu carrinho de lata de sardinha,
Com a rodinha de chinela havaiana.

Aqueles ficaram no sonho,
Estes eram minha realidade de brincar
E de sonhar...
E como eu os amava...

Mas um dia veio a madureza
E com ela novos sonhos
Que guardo ainda nesse armário azul,
Todos juntinhos, sem distinção
O armário de que lhes falo
É o imenso comboio de cordas
Que se chama coração!
(Professor Alves, meio melancólico)

terça-feira, 30 de maio de 2017

COMENTÁRIOS SOBRE O POEMA NUM MEIO-DIA DE FIM DE PRIMAVERA





           Esse é, com certeza, o poema mais belo dessa obra de Caeiro. Representa bem seu gosto pelas coisas simples, encontradas sempre na natureza. Assim como sua aversão à Igreja católica, mas seu grande apreço a Deus. Não deus da igreja, mas o Deus humilde e verdadeiro. Seguem alguns comentários.
          Este poema pode ser considerado por alguns como um sacrilégio, uma afronta à crença em Deus e sua enorme criação. Mas, como já comentamos em análises dem outros poemas de Caeiro, o que temos é uma crítica ao Deus criado pela igreja católica, como sendo um Deus "estúpido", justiceiro implacável. Assim sendo, o Menino Jesus, hora menino, ora crucificado (homem), aborrecido dess injúria para com Deus e ciente da sua necessidade na terra, desce e cá vem acompanhar o poeta, sendo unicamente sua inspiração, a poesia, a essência do poeta.


         Assim, ele  "desceu pelo primeiro raio que apanhou". Aqui podemos entender que há intertextualidade com O Pequeno Príncipe, de Exupery: "Creio que ele aproveitou, para evadir-se, pássaros selvagens que emigravam." Assim como o principezinho, Jesus pôs-se em fuga e trouxe para a terra a poesia magistral descrita por Exupery e por Pessoa. Podem dizer que viajo, mas toda leitura é uma viagem, não apenas pelo texto lido, mas uma reflexão eterna daquilo que já se leu. Graças que tenho lido muito, e posso fazer essas "viagens".
           Na sequência, o poeta nos revela por esse menino não pode deixar de ser o Menino Jesus. É uma criança normal, o menino Jesus, porque todas as crianças são menino Jesus. Daí a quase necessidade de ele não envelhecer. Exupery também não queria envelhecer, por isso se reinventa no Pequeno Príncipe, toda a poesia e todo anseio de sua existência, que é não querer ser homem grande reside nessa criação. Não se deve querer ser grande. e o principezinho (que é a poesia que habita o âmago de Exupery) insta a todo instante que ser grande não tem valor, pis o ser grande abandona tudo o que realmente tem valor que são as coisas simples, como o seu amor pela flor e a busca incessante de se fazer amigos e com eles se preocupar. Por isso, a dedicatória à criança que já foi um dia seu amigo Léon Werth. Vemos aí quase a voz de Caeiro, e seu apelo para que O Menino Jesus esteja sempre com ele, que possa com ele brincar e um dia, na sua velhice, cuide dele. Possa afagar-lhe os cabelos e o pôr para dormir.
           Por ser criança e divina, é também humana a alma de poeta, pois Cristo é poesia, é sensibilidade. Para resumir: simplicidade. Logo só as pessoas simples têm a jesus, porque veem a perfeição nas coisas simples, na natureza, como nas pedras do caminho, nas poças d'água e nas flores, da primavera. A vida de poeta é essas divina criança que habita o seu ser:

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate as palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.

Vejamos como é divina a alma de poeta. É ela que nos acorda a noite e brinca com nossos sonhos, transformando-os em poesia, transformando-os em realidade boa, nos mostrando aquilo que não vemos quando som os nós.E aqui me lembro de Chico Buarque que nos ensina que "os poetas, como os cegos, podem ver na escuridão". 
            é isso, podemos encerrar nossa reflexão de hoje com essas quatro referência: o guardador de rebanhos, Exupery, O Príncipe e o Menino Jesus, e o poeta!
(6/5/17)