domingo, 13 de fevereiro de 2011

PENA DE MORTE INSTITUÍDA NO BRASIL, SOMENTE PARA OS CIDADÃOS

12/02/2011




A pena de morte é proibida no Brasil, exceto em tempos de guerra, conforme a Constituição Federal, que no artigo 5, inciso XLVII, aboliu a pena de morte, "salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX".
A última execução determinada pela Justiça Civil brasileira, segundo pesquisa no Wikipédia, foi a do escravo Francisco, em Pilar, Alagoas, em 28 de abril de 1876.
Em crime de grande comoção nacional é comum o tema voltar à tona. Recentemente em 2007, o caso do menino João Hélio fez os meios de comunicação reacenderem a discussão sobre a reintrodução da pena de morte. O governo brasileiro, no entanto, vem demonstrando pouco ou nenhum interesse em reintroduzir a prática que já não é utilizada há mais de 135 anos, apesar de que o apoio popular ao uso da pena capital aumentou drasticamente no país graças à maciça divulgação do citado crime.
No entanto, pela legislação aprovada pela bandidagem, a pena capital há muito tempo está em pleno vigor, e com altos índices de execução. Pela lei implementada pelos marginais, ao contrário do que ocorre quando eles são presos, não há amplo direito de defesa tampouco é estabelecido um Tribunal do Júri. O julgamento é rápido e a execução é sumária não levando mais do que 1 minuto, em média. Para que isso ocorra,  não é necessário entender e nem argumentar os infindáveis artigos previstos no Código Penal, basta o cidadão esboçar uma ingênua reação e a sentença está decretada, fato ocorrido recentemente com Jesus Bezerra Bonfim que, desarmado, fez menção de tirar a “sua” carteira do bolso para entregar aos latrocidas. Foi o suficiente para o juiz do caso entender que ele estaria burlando o código da bandidagem e oferecendo perigo para a comunidade do crime e por isso não poderia mais viver. Foi alvejado impiedosamente com 3 tiros à queima-roupa, sem chances de defesa, o que não deverá acontecer com esses bandidos caso eles sejam presos, pois terão um julgamento “justo”, prolongado, podendo demorar vários dias e a instrução do processo,  anos. Sendo que ainda poderão voltar às ruas. Ao contrário do Jesus Bonfim.
O que dizer do caso Monteiro que abalou nossa comunidade. Monteiro, depois do dia estafante como tantos outros, estava sentando no aconchego do alpendre  de sua residência. Quando chegam dois assaltantes e anunciaram que queriam os seus pertences. Aflito, Monteiro tenta adentrar na sua residência. Mais uma vez o Tribunal do Crime entra rapidamente em ação. Os desalmados interpretam como atitude não condizente com o Código e em menos de minuto julgam e condenam. A pena foi de morte através de um tiro certeiro e mortal no tórax.
Desço do salto para dizer uma expressão utilizada de bate - pronto nesses momentos: “É de lascar!!”
Portanto, se faz necessário que leis rigorosas e atitudes enérgicas das autoridades legalmente constituídas possam coibir o avanço dessa espécie de Tribunal, sob pena da aplicação de mais um código em nosso ordenamento jurídico, no caso, o Código Hamurabi que tem como princípio basilar "olho por olho, dente por dente". Infelizmente.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

ANGÚSTIA E DESESPERO


No pequeno espaço de três dias fui sacudido por duas notícias no mínimo terríveis: dois latrocínios, assalto seguido de homicídio.

No primeiro, próximo de onde moro, houve um assalto a uma van de passageiros. Dois indivíduos, armados, anunciaram o assalto e passaram a recolher os pertences das vítimas. Quando já iam descer, dois jovens, 22 e 27 respectivamente, de comum acordo ou não, resolveram segurar os bandidos, que atiraram quatro vezes, deixando, dois mortos, duas mães desesperadas, amigos angustiados, namoradas em desalento e a população inteira aflita.

O segundo caso chocou mais porque ocorreu a uma pessoas conhecida da família. Jesus Bonfim, natural de Independência, homem pacato como o pai, residente no Montese, próximo ao Extra, vinha com o filho de uma padaria ou de um supermercado, não importa, quando foi abordado por três bandidos que anunciaram o assalto. Segundo consta, os energúmenos já haviam assaltado algumas mulheres no ponto de ônibus. Ao colocar a mão no bolso traseiro da calça para retirar a carteira, Jesus foi fuzilado pelos facínoras, na frente do filho de seis anos.

O que me incomoda não é a morte, mas o medo de viver sem saber até quando vou ter o direito de continuar respirando sobre esse chão. Em que momento vou ser abordado por bandidos, que se multiplicam nesta fortaleza de insegurança onde moramos, para entrar num estranho jogo de roleta russa. O que fazer? Falar com os elementos, para informar-lhes que vou tirar minha carteira do bolso? Levantar as mãos para cima e esperar que eles esvaziem os bolsos, arranquem o relógio do braço e levem o celular? Entregar, sem olhar para eles, a pochete com os pertences e pedir desculpas por não ter o suficiente para satisfazê-los? Entrar em desespero, começar a chorar, enquanto me desfaço dos pertences, entregando-lhos? Nenhuma das formas como nós agirmos, nos dará a certeza de salvar a nossa vida, pois estaremos a mercê do humor desses indivíduos, que agem a qualquer hora do dia e da noite sem serem molestados pela polícia.
É angustiante sair de casa e não saber se estaremos vivos quando formos vistos novamente por nossos familiares. Já cheguei ao desespero de dizer para meu filho que esteja preparado, caso uma desgraça como a citada acima venha a me acontecer. Disse a ele que onde estiver, amá-lo-ei como se estivesse ao seu lado e para ele crescer e ser um cidadão de bem, solidário, amigo, responsável. Ele, na sua tenra idade, não me entendeu direito, mas para me ver tranquilo disse que “tudo bem, nada vai acontecer, pai!”. E eu fico imaginando o desespero daquela criança de seis anos ao ver o pai morto daquela forma, que trauma!

Tenho certeza que como eu há uma legião de desesperados, cuja vontade é aquartelar-se em casa, sem nenhuma vontade de sair para o espaço sem lei que são as ruas dessa cidade cruel. Enquanto isso, soltos por aí estão os assaltantes, desfilando, frequentando restaurantes, padarias, supermercados, passeando livremente armados, só esperando o momento de agir e, se for preciso, ceifar mais uma vida inocente.
(Professor Alves, 11/02/2011)

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

HISTÓRIAS D REENCARNAÇÃO


“A encarnação é necessária ao duplo progresso moral e intelectual do espírito(...). a vida social é a pedra de toque das boas ou más qualidades.”
(Alan Kardec)

As aulas na faculdade se iniciaram no começo de fevereiro, portanto nesse mês não tive tempo para nada. Era mais ou menos pelo dia vinte quando Ernani me telefonou para dizer que o tal psiquiatra americano já estava em Fortaleza e que marcara o início das sessões de regressão para o sábado. Nos dois dias que antecederam a essa data eu me desdobrei para não deixar nenhuma atividade acadêmica para esse final de semana. Dessa forma sábado chegou, e nos reunimos na casa de Ernani para a já famigerada sessão. O médico explicou os procedimentos a serem executados e os problemas que poderiam ocorrer. Disse que mesmo nunca tendo presenciado ou tido notícias de efeitos negativos nos pacientes, era possível que eles ocorressem. Por isso o marido de Aliel teve de assinar um termo de compromisso, que foi guardado metodicamente pelo homem que se chamava Bob, apelido de Robert. Ele ainda perguntou a Aliel sobre seus traumas, suas fobias. Ela fez referência ao medo de tomar comprimido, “pois eles sempre ficam atravessados na garganta.” E colocou as duas mãos no pescoço e pôs a língua pra fora, fingindo estar sendo enforcada. Todos riram de sua atitude. Disse por fim um pouco séria sobre o principal motivo de estarmos ali, que era sua obsessão em achar que muitas pessoas as quais nunca vira parecerem-lhe familiares.
Depois dessa conversa que se deu de forma bem descontraída, o homem ligou o gravador e, em seguida, levou Aliel ao estado de hipnose. Aos poucos ela foi relatando o que via. Como se assistisse a um filme de trás pra frente. Chegou a idade de cinco anos e nos relatou alguns maus tratos infligidos pela mãe, que numa tentativa de mostrar às pessoas que a filha era normal, dava-lhe beliscões por baixo das mesas ou bicava suas pernas com a ponta da sandália. Nesses momentos Aliel parecia estar consciente e não hipnotizada, demonstrou bastante tristeza ao se referir aos fatos. Depois ela encolheu-se toda e ficou em posição fetal e pôs o dedo médio na boca. Aos poucos foi-se estirando novamente e em seus lábios apareceu um breve sorriso, que desapareceu dando lugar a uma expressão séria. E começou a falar:
“Eu ando por uma rua estreita, iluminada à luz de lampiões. Eu sou um homem, estou vestindo um terno azul, trago um chapéu na cabeça e tenho uma enorme barba. Entro por uma porta estreita e vejo meus camaradas, que me esperam. Estão todos taciturnos, preocupados. Todos me chamam de “o Escolhido” e também atendem por pseudônimos análogos. Há o Redentor, o Pensador e outros. O lugar onde me encontro é um espécie de bar e alguns gritam alto em espanhol “ ¿En este bar no hay nadie para servirnos?” E riem sem muita explicação. Do interior aparece uma mulher atarracada com algumas garrafas de vinho que distribui pelas mesas. Ao passar por nós ela diz algo como “Éste es vino de la medianoche”. É um código secreto. Agora eu me lembro, somos todos seguidores de Simon Bolívar e temos um plano de nos unirmos ao seu exército em Caracas. Entretanto há um mal estar, entre o grupo. Temos que esperar a meia-noite. Temos que aguardar com naturalidade para não despertar suspeitas nos outros frequentadores do ambiente. Um dos camaradas retira do paletó um jogo de cartas e jogamos, outros bebem, mas pouco, mesmo assim a tensão não passa. Agora a porta se abre com violência e homens fardados e armados com carabinas entram no salão. Todos vamos presos. Fomos traídos pela taberneira que vai mostrando ao chefe dos fardados quem faz parte do grupo e quem não faz. Ficamos então sabendo que Simon já está refugiado em um país vizinho. Os soldados se aproximam de nós e com suas adagas cortam-nos a garganta. É grande o transtorno dos outros colegas vendo nossos corpos estrebucharem pelo chão coberto de sangue...”
Nesse instante Aliel tornou-se ofegante, com grande dificuldade de respirar. Ela por algumas vezes levou a mão em direção ao pescoço, mas seu ofego foi diminuindo, seu rosto se iluminando. Ela nos contou que fora levada por uma luz e que permaneceu nela um tempo que julgava infinito. Depois começou a espernear como fazem os bebês e nos narrou mais uma de suas vidas. Nesta ela era uma religiosa em missão de caridade numa comunidade pobre no sul da áfrica. Lá sua grande inimiga era a fome que consigo trazia toda sorte de moléstias físicas e morais, narrou-nos seu sofrimento ao ver o semblante da miséria estampada nos olhos e corpos daquelas criaturas desgraçadas. Contou-nos também de sua morte aos oitenta anos rodeada pelas pessoas que tanto ajudara, uma morte, como ela mesma descreveu, feliz.
Nos dias que se seguiram, as sessões se repetiram. Esse trabalho durou exatamente dez meses e aliel regrediu a mais de cinquenta encarnações. Umas sem grande importância, outras contribuíram de forma decisiva para que ela e nós entendêssemos todos os males que a afligiam, todas suas angústias e temores foram desvendados nessas regressões. Entretanto para mim a mais significativa foi quando ela regrediu há aproximadamente mil anos e se viu como Ranjicniami. Nesse período eu estudava fora de horário e até de madrugada para não perder essas sessões, que depois eram cuidadosamente analisadas por nós e pelo psiquiatra, e das fitas eram tiradas, com o consentimento do casal, cópias, para, segundo ele, quando tivesse coragem, publicar um livro com essas experiências e assim enfrentar a comunidade cientifica.
Foi possivelmente, não lembro bem, na décima quinta sessão que Aliel lembrou pela primeira sua vida como Ranjicniami. Falou do nascimento, da infância, das ameaças do pai, das angústias, do medo que todos na ilha tinham das ondas gigantes. Na segunda vez ela relatou o nosso encontro e novamente lembrou seu nascimento e as ameaças do pai. Foi com grande aflição que, em uma outra sessão, relatou nossa morte causada pelas ondas gigantes que nos arremessaram contra as pedras. Às vezes ela passava inúmeras sessões sem lembrar dessa encarnação, seu ser se voltava para momentos sem grande importância como brincadeiras de infância ou simples discussões familiares. Depois ela voltava a lembrar-se de quando era Miciane e eu Daniel. E já nas últimas reuniões ela só regredia a duas vidas: como Ranjicniami e como Miciane. Essas duas existências de aliel eram os elos que nos ligavam, formavam aquilo que antes era o mistério de nossas vidas. Nós nos amávamos de duas formas diferentes, mas que se completavam. Eu a amava e a protegia enquanto ela era Miciane, e a amava, queria-lhe como um louco enquanto Ranjicniami. Entretanto não pude concluir aquilo que poderíamos chamar de nossa missão. Há mil anos fomos arrebatados pelas águas do oceano e tivemos nosso destino interrompido. Como seu irmão, coincidentemente com o mesmo nome que tenho agora, Daniel, não pude protegê-la das maldades perpetradas pela nossa tia, pois morri precocemente em um acidente de trem. Agora era diferente. Nesta vida tínhamos toda a oportunidade de nos realizarmos, de concluirmos aquilo que talvez seja o motivo de nossa estada aqui na terra: amarmos um ao outro em toda sua plenitude. Somos almas gêmeas que precisamos nos completar, somos as metades da laranja separadas pelo fio da faca do destino e que precisamos nos unir para que nossas almas tenham finalmente paz.
No mês de novembro, encerraram-se as reuniões. O americano deu seu trabalho por concluído. As vidas de Aliel haviam sido dissecadas, se havia uma ou outra que não vieram à tona eram sem grande importância. O próprio médico fez referência ao fato de o mistério de nossas existências estar na análise dessas duas vidas. Ernani sabia disso, mas sabia também que seu destino não o havia colocado diante de aliel por acaso, inclusive ele aparecia mais em suas outras vidas do que eu, era sempre seu pai, amigo, avô, confidente. Ele sabia da importância de seu papel na consecução do destino da esposa. Ele a amava e não abriria mão de seu amor. Ela compreendia agora todo o carinho que nutria pelo marido, com quem se dava muito bem. E isso é amor. Além do mais, conhecia seus compromissos como pessoa socialmente comprometida, não podia abdicar de seu matrimônio. Além de tudo isso, havia entre todos nós o Destino como mediador, diante do que foi visto durante todo esse tempo, nós sabíamos que infringir as suas leis era quebrar uma corrente que fora elada há milhões de anos e que, portanto, não havia nada que pudesse ser feito. Tudo devia continuar como estava: Aliel casada e amando seu marido; eu amando-a e respeitando sua condição; Ernani amando a mulher e sendo amada por ela, sendo meu amigo e crendo na minha fidelidade. Só uma coisa mudara, aliás duas: a cura definitiva de todos os males que acometiam Aliel e a nossa compreensão de tudo o que nos cercava. E só uma coisa não sabíamos: em que teias o futuro, que enreda destinos silenciosamente, nos iria jogar. 
(Professor Alves, De Vida, de sonhos e de Encontros

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

A CARTA DA TERRA



PREÂMBULO

Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, 
numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. 
À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente
e frágil, o futuro reserva, ao mesmo tempo, grande perigo e 
grande esperança. Para seguir adiante, devemos reconhecer
que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas 
e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade 
terrestre com um destino comum. Devemos nos juntar 
para gerar uma sociedade sustentável global fundada 
no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, 
na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a 
este propósito, é imperativo que nós, os povos da 
Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com 
os outros, com a grande comunidade de vida e com as futuras gerações.

TERRA, NOSSO LAR

A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, é viva 
como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência 
uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais 
para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade de vida e 
o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável 
com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, 
águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma 
preocupação comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza 
da Terra é um dever sagrado.

A SITUAÇÃO GLOBAL

Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, 
esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo 
arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos equitativamente 
e a diferença entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância 
e os conflitos violentos têm aumentado e são causas de grande sofrimento. O crescimento 
sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológico e social. 
As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não 
inevitáveis.

DESAFIOS FUTUROS

A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da 
Terra e  uns dos outros ou arriscar a nossa destruição e a 
da diversidade  da vida. São necessárias mudanças fundamentais
em nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos 
entender que, quando as necessidades básicas forem supridas,
o desenvolvimento  humano será primariamente voltado a 
ser mais e não a ter mais.  Temos o conhecimento e a tecnologia 
necessários para abastecer  a todos e reduzir nossos impactos 
no meio ambiente. O surgimento de uma sociedade civil 
global está criando novas oportunidades para construir 
um mundo democrático e humano. Nossos desafios ambientais, econômicos, 
políticos, sociais e espirituais estão interligados e juntos podemos forjar 
soluções inclusivas.

RESPONSABILIDADE UNIVERSAL

Para realizar estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de 
responsabilidade universal, identificando-nos com a comunidade terrestre como 
um todo, bem como com 
nossas comunidades locais. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e 
de um mundo no qual as dimensões local e global estão ligadas. Cada um 
compartilha responsabilidade pelo presente e pelo futuro bem-estar da família 
humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de 
parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério 
da existência, com gratidão pelo dom da vida e com humildade em relação ao lugar 
que o ser humano ocupa na natureza.
Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores básicos para 
proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, 
juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios, interdependentes, visando a um 
modo de vida sustentável como padrão comum, através dos quais a conduta de todos 
os indivíduos, organizações, empresas, governos e instituições transnacionais será dirigida
e avaliada.

PRINCÍPIOS

I. RESPEITAR E CUIDAR DA COMUNIDADE DE VIDA

1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade.

a) Reconhecer que todos os seres são interdependentes e cada forma de vida tem valor,
 independentemente de sua utilidade para os seres humanos.

b) Afirmar a fé na dignidade inerente de todos os seres humanos e no potencial 
intelectual, artístico, ético e espiritual da humanidade.
    2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor.

    a) Aceitar que, com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais, 
    vem o dever de prevenir os danos ao meio ambiente e de proteger os direitos das pessoas.


    b) Assumir que, com o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do poder, vem a
    maior responsabilidade de promover o bem comum.
      3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, 
      sustentáveis e pacíficas.


      a) Assegurar que as comunidades em todos os níveis garantam os direitos humanos e 
      as liberdades fundamentais e proporcionem a cada pessoa a oportunidade de realizar seu 
      pleno potencial.

      b) Promover a justiça econômica e social, propiciando a todos a obtenção de uma 
      condição de vida significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.
        4. Assegurar a generosidade e a beleza da Terra para as atuais e às futuras 
        gerações.


        a) Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas necessidades 
        das gerações futuras.

        b) Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apoiem 
        a prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra a longo prazo.
          II. INTEGRIDADE ECOLÓGICA

          5. Proteger e restaurar a integridade dos sistemas 
          ecológicos da Terra, com especial atenção à 
          diversidade biológica e aos processos naturais que 
          sustentam a vida.


          a) Adotar, em todos os níveis, planos e
          regulamentações de desenvolvimento 
          sustentável que façam com que a 
          conservação e a reabilitação ambiental sejam parte 
          integral de todas as iniciativas de desenvolvimento.

          b) Estabelecer e proteger reservas naturais e da biosfera viáveis, incluindo terras 
          selvagens e áreas marinhas, para proteger os sistemas de sustento à vida da Terra, 
          manter a biodiversidade e preservar nossa herança natural.

          c) Promover a recuperação de espécies e ecossistemas ameaçados.

          d) Controlar e erradicar organismos não-nativos ou modificados geneticamente que
          causem dano às espécies nativas e ao meio ambiente e impedir a introdução desses
          organismos prejudiciais.


          f) Administrar o uso de recursos renováveis como água, solo, produtos florestais e vida 
          marinha de forma que não excedam às taxas de regeneração e que protejam a saúde 
          dos ecossistemas.

          g) Administrar a extração e o uso de recursos não-renováveis, como minerais e 
          combustíveis fósseis de forma que minimizem o esgotamento e não causem dano
          ambiental grave.
            6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção 
            ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura 
            de precaução.


            a) Agir para evitar a possibilidade de danos ambientais sérios ou irreversíveis, 
            mesmo quando o conhecimento científico for incompleto ou não-conclusivo.

            b) Impor o ônus da prova naqueles que afirmarem que a atividade proposta não 
            causará dano significativo e fazer com que as partes interessadas sejam responsabilizadas 
            pelo dano ambiental.
            c) Assegurar que as tomadas de decisão considerem as consequências cumulativas, 
            a longo prazo, indiretas, de longo alcance e globais das atividades humanas.

            d) Impedir a poluição de qualquer parte do meio ambiente e não permitir o aumento 
            de substâncias radioativas, tóxicas ou outras substâncias perigosas.

            e) Evitar atividades militares que causem dano ao meio ambiente.
              7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam 
              as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar 
              comunitário.


              a) Reduzir, reutilizar e reciclar materiais usados nos sistemas de produção e 
              consumo e garantir que os resíduos possam ser assimilados pelos sistemas ecológicos.

              b) Atuar com moderação e eficiência no uso de energia e contar cada vez mais 
              com fontes energéticas renováveis, como a energia solar e do vento.


              c) Promover o desenvolvimento, a adoção e a transferência equitativa de tecnologias
              ambientais seguras.


              d) Incluir totalmente os custos ambientais e sociais de bens e serviços 
              no preço de venda e habilitar os consumidores a identificar produtos que 
              satisfaçam às mais altas normas sociais e ambientais.

              e) Garantir acesso universal à assistência de saúde que fomente a saúde 
              reprodutiva e a reprodução responsável.

              f) Adotar estilos de vida que acentuem a qualidade de vida e subsistência 
              material num mundo finito.
                8. Avançar o estudo da sustentabilidade ecológica e promover o 

                intercâmbio aberto e aplicação ampla do conhecimento adquirido.

                a) Apoiar a cooperação científica e técnica internacional relacionada à 
                sustentabilidade, com especial atenção às necessidades das nações em desenvolvimento.


                b) Reconhecer e preservar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria 
                espiritual em todas as culturas que contribuem para a proteção ambiental e o 
                bem-estar humano.

                c) Garantir que informações de vital importância para a saúde humana e para 
                a proteção ambiental, incluindo informação genética, permaneçam disponíveis 
                ao domínio público.
                  III. JUSTIÇA SOCIAL E ECONÔMICA

                  9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental.


                  a) Garantir o direito à água potável, ao ar puro, à 
                  segurança alimentar, a os solos não contaminados, 
                  ao abrigo e saneamento seguro, alocando 
                  os recursos nacionais e internacionais demandados.

                  b) Prover cada ser humano de educação e recursos 
                  para assegurar uma condição de vida sustentável 
                  e proporcionar seguro social e
                  segurança coletiva aos que não são capazes de 
                  se manter por conta 
                  própria.

                  c) Reconhecer os ignorados, proteger os vulneráveis, servir 
                  àqueles que sofrem e 
                  habilitá-los a desenvolverem suas capacidades e alcançarem suas aspirações.
                    10. Garantir que as atividades e instituições econômicas em 
                    todos os níveis promovam o desenvolvimento humano de forma equitativa 
                    e sustentável.


                    a) Promover a distribuição equitativa da riqueza dentro das e entre as nações.

                    b) Incrementar os recursos intelectuais, financeiros, técnicos e sociais das nações 
                    em desenvolvimento e liberá-las de dívidas internacionais onerosas.

                    c) Assegurar que todas as transações comerciais apoiem o uso de recursos 
                    sustentáveis, a proteção ambiental e normas trabalhistas progressistas.

                    d) Exigir que corporações multinacionais e organizações financeiras internacionais 
                    atuem com transparência em benefício do bem comum e responsabilizá-las pelas 
                    consequências de suas atividades.


                    11. Afirmar a igualdade e a equidade dos gêneros como pré-requisitos 
                    para o desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à 
                    educação, assistência de saúde e às oportunidades econômicas.


                    a) Assegurar os direitos humanos das mulheres e das meninas e acabar com toda 
                    violência contra elas.

                    b) Promover a participação ativa das mulheres em todos os aspectos da vida 
                    econômica, política, civil, social e cultural como parceiras plenas e paritárias, 
                    tomadoras de decisão, líderes e beneficiárias.


                    c) Fortalecer as famílias e garantir a segurança e o carinho de todos os 
                    membros da família.
                      12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas 
                      a um ambiente natural e social capaz de assegurar a dignidade humana, 
                      a saúde corporal e o bem-estar espiritual, com especial atenção aos 
                      direitos dos povos indígenas e minorias.
                      a) Eliminar a discriminação em todas as suas formas, como as baseadas em raça, cor, 
                      gênero, orientação sexual, religião, idioma e origem nacional, étnica ou social.
                      b) Afirmar o direito dos povos indígenas à sua espiritualidade, conhecimentos,
                      terras e recursos, assim como às suas práticas relacionadas com condições de vida 
                      sustentáveis.

                      c) Honrar e apoiar os jovens das nossas comunidades, habilitando-os a cumprir seu

                      d) papel essencial na criação de sociedades sustentáveis.

                      e) Proteger e restaurar lugares notáveis pelo significado cultural e espiritual.
                        IV. DEMOCRACIA, NÃO-VIOLÊNCIA E PAZ

                        13. Fortalecer as instituições democráticas em todos os níveis e prover 
                        transparência e responsabilização no exercício do governo, participação 
                        inclusiva na tomada de decisões e acesso à justiça.

                        a) Defender o direito de todas as pessoas receberem informação clara e oportuna 
                        sobre assuntos ambientais e todos os planos de desenvolvimento e atividades 
                        que possam afetá-las ou nos quais tenham interesse.

                        b) Apoiar sociedades civis locais, regionais e globais e promover a participação 
                        significativa de todos os indivíduos e organizações interessados na tomada de decisões.

                        c) Proteger os direitos à liberdade de opinião, de expressão, de reunião 
                        pacífica, de associação e de oposição.

                        d)Instituir o acesso efetivo e eficiente a procedimentos judiciais administrativos e 
                        independentes, incluindo retificação e compensação por danos ambientais e pela 
                        ameaça de tais danos.

                        e) Eliminar a corrupção em todas as instituições públicas e privadas.

                        f) Fortalecer as comunidades locais, habilitando-as a cuidar dos seus próprios 
                        ambientes, e atribuir responsabilidades ambientais aos níveis governamentais 
                        onde possam ser cumpridas mais efetivamente.
                          14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os
                           conhecimentos,  valores e habilidades necessárias para um modo de 
                          vida sustentável.

                          a) Prover a todos, especialmente a crianças e jovens, oportunidades educativas que
                          lhes permitam contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável.

                          b) Promover a contribuição das artes e humanidades, assim como das ciências, 
                          na educação para sustentabilidade.

                          c) Intensificar o papel dos meios de comunicação de massa no aumento da 
                          conscientização sobre os desafios ecológicos e sociais.

                          d) Reconhecer a importância da educação moral e espiritual para uma condição 
                          de vida sustentável.
                            15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração.

                            a) Impedir crueldades aos animais mantidos em sociedades humanas e protegê-los 
                            de sofrimento.

                            b)Proteger animais selvagens de métodos de caça, armadilhas e pesca que causem 
                            sofrimento extremo,  prolongado ou evitável.

                            c) Evitar ou eliminar ao máximo possível a captura ou destruição de espécies não visadas.
                              16. Promover uma cultura de tolerância, não-violência e paz.

                              a) Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação 
                              entre todas as pessoas, dentro das e entre as nações.

                              b) Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos violentos e usar
                              a  colaboração na resolução de problemas para administrar e resolver conflitos 
                              ambientais e outras disputas.

                              c) Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até o nível de uma postura 
                              defensiva não-provocativa e converter os recursos militares para propósitos 
                              pacíficos, incluindo restauração ecológica.  

                              d) Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição em massa.

                              e) Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico ajude a proteção ambiental e a paz.

                              f) Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações corretas consigo mesmo, 
                              com outras pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e com a totalidade 
                              maior da qual somos parte.
                                O CAMINHO ADIANTE

                                Como nunca antes na História, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. 
                                Tal renovação é a promessa destes princípios da Carta da Terra. Para cumprir esta 
                                promessa, temos que nos comprometer a adotar e promover os valores e objetivos da Carta.
                                Isto requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de
                                interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver 
                                e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável nos níveis local, 
                                nacional, regional e global. Nossa diversidade cultural é uma herança 
                                preciosa e diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de 
                                realizar esta visão. Devemos aprofundar e expandir o diálogo global que 
                                gerou a Carta da Terra, porque temos muito que aprender a 
                                partir da busca conjunta em andamento por verdade e sabedoria.
                                A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isto pode 
                                significar escolhas difíceis. Entretanto, necessitamos encontrar caminhos para 
                                harmonizar a diversidade com a unidade, o exercício da liberdade com o bem 
                                comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo indivíduo, 
                                família, organização e comunidade tem um papel vital a desempenhar. As artes, 
                                as ciências, as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, 
                                as empresas, as organizações não-governamentais e os governos são todos 
                                chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre governo, sociedade 
                                civil e empresas é essencial para uma governabilidade efetiva.
                                Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem 
                                renovar seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir com suas 
                                obrigações respeitando os acordos internacionais existentes e apoiar a implementação 
                                dos princípios da Carta da Terra com um instrumento internacionalmente 
                                legalizado e contratual sobre o ambiente e o desenvolvimento.
                                Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face 
                                à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação 
                                dos esforços pela justiça e pela paz e a alegre celebração da vida. 

                                Do site: http://www.cartadaterrabrasil.org/prt/text.html (com a grafia atualizada) 

                                sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

                                SUPERAÇÃO I

                                     (Professor Alves, fevereiro de 2011)  
                                     
                                Quando ouvimos falar de histórias de superação, lembramos sempre de atletas, jogadores de futebol, músicos e afins que  conseguiram superar limitações, de um modo geral, de ordem física, deficiência auditiva ou visual, ou mesmo retardamento mental. Todavia, cada um de nós conhece histórias de superação que têm como protagonistas pessoas comuns.  Precisamos, pois, repassá-las adiante para que pessoas também comuns as quais têm alguma limitação possa também nelas se espelhar e vencerem seus obstáculos. Contaremos a seguir algumas histórias reais, de pessoas comuns que em busca da Felicidade ou apenas para viver em paz tiveram que superar barreiras de ordens diversas e que, por isso, são exemplos de superação.


                                Corria o ano de 1965. O cidadão acercou-se do balcão às 6:30 da manhã e pediu uma cachaça ao homenzinho debaixo do boné, como diria Drumond. O homem, enquanto despejava o líquido no copo, fez o seguinte comentário:
                                ̶  Seu Luís, ouvi dizer que  nasceu mais um filho seu!
                                ̶  É, foi, diz a mulher. Respondeu o outro com um ar entre sério e reflexivo, com os olhos no chão.
                                O que servia, então, emendou:
                                ̶  Não tenho nada com sua vida, homem, mas acho que está na hora de você pensar em deixar a bebida. Conheço sua mulher e sei o sacrifício que a coitada faz para botar comida dentro de casa quando você está sem trabalho, lavando e engomando. Passa aqui todo dia com uma trouxa de roupa na cabeça... E você, homem, é um senhor pedreiro, mas num segura serviço, por causa do vício. Se  largasse a cachaça, podia cuidar melhor da família... Já são quantos filhos, doze? 
                                Seu Luís, cabisbaixo, examinando as alpargatas esbranquiçadas pela cal ou os pés inchados pelo efeito do álcool, meneou negativamente a cabeça e corrigiu o número para dez. Olhou o conteúdo do copo, a boca cheia d'água, engoliu a saliva, depositou o copo sobre o balcão e falou com a voz que era um misto de rancor e resignação:
                                ̶  Pois pode guardar sua merda, que eu nunca mais bebo...  ̶  e saiu, porém ainda ouviu quando o dono do bar disse:
                                ̶  Mas num pode ser assim, cumpade, no seu estado é perigoso abandonar a bebida duma vez...
                                naquele dia, ao chegar ao canteiro de obras, Seu Luís era a própria imagem da desolação. Como não havia “matado o bicho”, seu corpo formigava e a irritação começava a tomar conta de sua cabeça. Tudo o incomodava: o cheiro do cimento, o sol escaldante, as pilhérias dos colegas. Às dez horas, olhou na direção do bar que ficava perto da obra... quase se rendia! Mas resistiu. Depois do almoço, não conseguia trabalhar. Sua cabeça estava fixa num único pensamento: não ia mais beber, entretanto o apelo do corpo lhe pedia o contrário, e nessa briga entre Deus e o diabo ele era a parte mais frágil. O desespero aumentava. Contou ao mestre o que estava acontecendo e comunicou que ia embora.
                                ̶  Vá, Seu Luís, estamos do seu lado. E que Deus te proteja!
                                No caminho de casa, os bares se multiplicavam, pessoas riam nas portas virando copos cheios de aguardente, vinho, cerveja. Parecia que o mundo inteiro bebia e que a bebida era aúnica coisa que importava e para a qual todos viviam. Não havia casas, não havia igrejas; só bares, biroscas, botequins. Tentou evitar o bar do Quincas, onde estivera cedo, mas não dava. Ouviu quando uma voz o chamou:
                                ̶  Luís, vem cá!
                                Passando as mãos pelos beiços, ele se aproximou e ouviu histórias dos colegas de infortúnio, mas não entendia nada, seus ouvidos eram todos olfato, seu olfato era todo visão e tudo convergia para o cérebro, que era só confusão. Despediu-se e foi para casa. Nem falou com a mulher, Dona Nazaré. Nem ouviu os filhos pedirem a bênção. Foi para o terreiro e tomou banho, mas quanto mais se molhava, mais o fogo esquentava-lhe o corpo. A mulher estranhou seu comportamento calado, não atinava que em seu âmago travava-se uma luta surda silenciosa entre o desejo do álcool e a vontade de abandonar para assim poder, como disse o Quincas, dar uma vida melhor à família. 
                                Naquela noite mal tocou na comida, seus olhos estavam vidrados, parecia um bicho enjaulado. Quando pegou no sono, foi surpreendido por um homem que o perseguia numa moto, cujo barulho ensurdecedor, quase o leva à loucura. Seus gritos acordaram a companheira, que o viu   todo contorcido sobre a cama. Quando ela o abraçou, ele chorava baixinho, e com sua clarividência feminina ela compreendeu o que estava se passando... Durante sete dias e sete noites, Seu Luís teve momentos de quase insanidade e delírios alucinantes.
                                Passado esse período de desintoxicação, ele foi recobrando a consciência. Tomou um caldo  de galinha, concientemente, tomou banho e saiu de casa pela primeira vez. No dia seguinte foi ao trabalho. O mestre, por experiência própria, compreendeu o que ele passou e como se sentia. Seu lugar na construção estava aguardando por ele. Nunca mais encostou um copo de bebida nos lábios. Evitou os bares, mas não os amigos, que o viram, da noite para o dia, tornar-se outro homem, seguro no emprego e manteve-se próximo à família. Cinco anos depois era mestre de obras de uma grande empresa, Ortecal, comprou terreno, junto com uma irmã, construiu casa própria e nunca mais deixou nada faltar em casa. 
                                Faleceu em agosto de 2009, aos 85 anos. Seu corpo foi sepultado sob uma salva de palmas dos filhos, filhas, netos, bisnetos, genros, noras e amigos. Posso dizer, sem medo de estar errado:

                                MEU PAI É UM EXEMPLO DE SUPERAÇÃO!

                                O VELHO POTE RACHADO

                                f
                                http://www.blogger.com/post-edit.g?blogID=8911057507813363548&postID=3727408489791143262
                                          Houve na Índia, um carregador de água que levava dois potes grandes, cada um deles pendurado em uma ponta da vara  que ele levava apoiada nos ombros. Um dos potes tinha uma rachadura, enquanto o outro era perfeito e sempre chegava cheio ao fim da longa jornada, entre o poço e a casa do senhor para quem o homem trabalhava. Toda vez o pote rachado chegava com água só até a metade.    
                                          Foi assim por dois anos. Todos os dias o carregador entregava pote e meio  de água na casa do seu senhor. É claro que o pote perfeito estava orgulhoso de suas realizações. O pote rachado, porém, estava envergonhado de sua imperfeição. Sentia-se miserável por realizar somente a metade do que lhe havia sido determinado fazer.
                                          Após perceber que durante dois anos não havia cumprido sua função a contento, o pote rachado, um dia, disse para o carregador, à beira do poço:
                                           - Estou envergonhado! Quero-lhe pedir desculpas.
                                           - Por quê? - perguntou o homem - De que você está envergonhado?
                                           - Nesses dois anos, - disse o pote - fui capaz de entregar apenas metade da minha carga, pois essa rachadura faz com que a água vaze por todo o caminho que leva à casa do seu senhor. Por causa da minha falha você não é recompensado inteiramente.       
                                          O carregador ficou triste pela situação do pote e, com compaixão, disse:
                                        - Quando retornarmos à casa do meu senhor, quero que observe as flores crescidas ao longo do caminho.
                                          De fato, à medida que eles subiam a montanha, o pote rachado observou muitas e belas flores selvagens à beira do caminho, o que o encheu de entusiasmo. Mas no fim da estrada, ele voltou a ficar abatido porque mais uma vez metade da água se perdera, e de novo pediu desculpas ao carregador. 
                                          O carregador, então, disse ao pote:
                                          - Você notou que no caminho havia flores só do seu lado? Não percebeu que a cada dia, enquanto voltávamos do poço, era você que as regava? Por dois anos colhi flores que lá nasceram para adornar a mesa do meu senhor. Se você não fosse do jeito que é, ele não teria belas flores para embelezar a casa dele.
                                              (Texto do domínio público)

                                quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

                                AMAR É PRECISO

                                        Todo ser humano precisa de carinho. Se Cristo dizia para que amássemos uns aos outros, era porque sabia dessa necessidade humana. Sempre que conhecemos alguém, com um pouco de sensibilidade, notamos essa ansiedade por ser amado. Esse amor a que Cristo aludia é um sentimento simples, como a atenção dispensada a alguém, uma palavra de conforto, um aperto de mão, um “tudo bem!”, um elogio, uma validação.

                                Há alguns dias, enquanto acompanhava meu filho ao treino da escolinha de futebol, fiquei observando um cidadão conversando com outro, um amigo particular, a respeito de seu cãozinho, na verdade uma cadela,  que desaparecera. Ele falava da tristeza do filho e da filha, e em seu semblante eu percebi que lhe fazia bem ser ouvido, pois além de servir de lenitivo para a sua angústia de não poder resolver esse problema  familiar, lhe dava o amparo de que precisava para seguir sua rotina habitual e forças para continuar essa busca.
                                Acompanhei sempre esses diálogos à distância. Até que um dia o amigo não veio. Percebi que o homem procurava por ele, imaginando que estava demorando, mas que logo chegaria. De súbito, percebi que o amigo daquele homem não viria e que nele ficaria o vácuo daquela ausência. Resolvi substituí-lo. Aproximei-me do homem e abordei-lhe sobre se havia encontrado o animal de estimação da família. Informei-lhe que havia escutado seu diálogo de alguns dias a respeito do sumiço do animal, sobre como estavam seus filhos... O semblante do homem desconhecido se iluminou, seus olhos brilhavam de tal forma que me senti feliz. Ele estava enormemente agradecido pelo fato de eu me incomodar com seu sofrimento. Em poucas palavras me pôs a par do que estava acontecendo, e no final, antes de ir embora, me agradeceu com um efusivo aperto de mão.
                                Assim todos os dias que nos encontrávamos, ele me chamavas para perto de si e do amigo e  nos punha a par de como estavam as buscas. Até que um dia acabou. Ele chegou, cumprimentou o amigo, chamou-me para perto de si, abraçou primeiro o amigo, depois a mim e, enxugando uma lágrima teimosa, contou que havia encontrado a cadelinha e que a família estava novamente completa.
                                Depois desse dia, o homem sempre me tratou como amigo, me cumprimenta, pergunta como está minha família, conta sobre suas coisas. Se me encontra no supermercado, vai até mim, mantém um rápido diálogo e me convida para ir a sua casa. Infelizmente adio esse momento por motivos vários, mas um dia o farei, pois aquele homem é meu amigo.  
                                        (Professor Alves, 03/02/2011)