quinta-feira, 21 de abril de 2011

DOM CASMURRO


        
            Um dos romances mais interessantes de se lê é Dom Casmurro, de Machado de assis. Quem não o leu, faça-o. Será um prazer tão imenso que possivelmente será difícil encontrar outro similar. Desculpem-me a exageração, como diria o próprio machado, mas vai aí um fundo de verdade. A linguagem de machado de Assis é responsável pelo sucesso da obra, até mais do que a história. O modo como é conduzida a trama é a linguagem. Vejamos esse pequeno trecho:
           "Não me pude ter. As pernas desceram-me os três degraus que davam para a chácara, e caminharam para o quintal vizinho. Era costume delas, às tardes, e às manhãs também. Que as pernas também são pessoas, apenas inferiores aos braços, e valem de si mesma, quando a cabeça não as rege por meio de ideias." (Capítulo XIII)
           Se a história é genial no que tange a dúvida  do adultério que permeia a mente de quem discute a obra sob esse ponto, a linguagem é genialíssima, como diria a personagem José Dias, pela objetividade, pela metáfora da existência que desenvolve, pelo vocábulo que lhe preenche as entranhas. 
       Fazia tempo que não o lia, e algumas passagens já me haviam esquecido. Tomei-o novamente e descobri mais uma vez o prazer da leitura. Quando eu era pequeno, dez anos, acho, li um livro que me pareceu divino: Amor, o pacto quebrado, de Bábara Cartland. Cinco anos, li-o novamente. A história me pareceu interessante, mas já encontrei algumas falhas de descrição, sequência. Mais à frente li-o novamente e já o achei uma lástima. A culpa não é da autora, mas minha, que cansei de ler histórias em quadrinho, livros de bolso e fui ler José de alencar, Aluísio Azevedo. 
          Com Machado, conforme dito acima, isso não acontece. Cada vez que lemos mais descobrimos maravilhosas construções. Enigmas linguísticos vão sendo desfeitos e releituras vão se fazendo em nossos conceitos. Vejam o trecho abaixo, para depois me dizer se vale ou não a pena ler Dom Casmurro.
                     "O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não consegui recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a fisionomia é diferente. Se só me faltassem os outros, vá um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mais falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo. O que aqui está é, mal comparando, semelhante à pintura que se põe na barba e nos cabelos, e que apenas conserva o hábito externo, como se diz nas autópsias; o interno não aguenta tinta. Uma certidão que me desse vinte anos de idade poderia enganar os estranhos, como todos os documentos falsos, mas não a mim. Os amigos que me restam são de data recente; todos os antigos foram estudar a geologia dos campos-santos. Quanto às amigas, algumas datam de quinze anos, outras de menos, e quase todas creem na mocidade. Duas ou três fariam crer nela aos outros, mas a língua que falam obriga muita vez a consultar os dicionários, e tal frequência é cansativa." (Cap. II)
    (Professor alves, 13/04/2011)

terça-feira, 19 de abril de 2011

CIÚME

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Sobre toda estrada, sobre toda sala
Paira, monstruosa, a sombra do ciúme!”
(Caetano Veloso)

       Há alguns textos os quais tenho vontade de escrever, mas me falta competência; para outros, me falta disposição e para outros, coragem. Há alguns anos fiz um soneto sobre o tema ciúme. Queria mesmo era contar uma breve história que me aconteceu, felizmente ainda na adolescência, a respeito desse maléfico sentimento. Mas me faltou coragem. Deve ser assim, sempre que queremos escrever algo que denuncia um momento de fraqueza. O soneto não saiu como queria. Sou poeta fraco. Desculpem-me os leitores se teimo em fazer versos. A narrativa não sairá melhor, pois também não sou bom com as frases. Mas vá lá. Faço-o por descargo de consciência.
      Tinha eu dezessete anos e ela quinze. Era a minha primeira paixão. Primeira não, segunda. A primeira entra em uma outra narrativa a qual também não tive ainda coragem de abordar. Chamava-se Cristiane, era a mais linda garota que até então tinha namorado. Estava deveras apaixonado. Todo meu ser vivia para ela, por ela e com ela. Ficava-me difícil até as leituras com as quais passava os tempos vagos. As brechas que se formavam entre as palavras traziam-lhe o rosto lindo, alvo e sempre sorridente. Na igreja, as palavras do padre “Deus esteja sempre convosco” eram para mim e para ela, e eu quase podia sentir a presença do onipotente nos abençoando. As flores dos quintais eram por mim dedicadas a ela, que trazia dia após dia uma enfiada no vale, formado pelo relevo de sua geografia física, labirinto por onde vagavam meus sonâmbulos desejos. Era amor, ara paixão, era loucura, era a adolescência. Quem já foi ou é adolescente e amou ou está amando sabe do que estou falando.     Todos os dias ia buscá-la na escola. Estudávamos à noite, mas não me lembro por que não estava indo à escola naquele tempo. Às nove e trinta já estava eu à sua espera, que só saía às dez e meia. É que não queria deixá-la esperando. Quando saía da escola, dava-me a mão e andávamos a passos lentos, cumprimentávamos pessoas conhecidas, falávamos abobrinhas, ríamos não sei de quê. Até chegarmos à sua casa, um beijo, um abraço. Eu ia para casa para sonhar que nosso namoro ia além daquilo.
    Certo dia, estava na esquina conversando com uns amigos, esperando a hora sagrada, quando o Maurício chegou. Olhei apressado para o relógio, que marcava apenas oito horas e alguns minutos. Maurício era colega de sala de Cristiane, e isso me fez acender de pronto uma luz fosca. Indaguei-lhe sofregamente o que havia acontecido, ao que ele me informou que faltara luz na escola e os alunos foram liberados mais cedo.  
      — E a Cristiane!? Perguntei-lhe, tentando controlar minha ansiedade.
      — Libriano, não sei não, da última vez que a vi ela estava conversando com o Francisco Antônio.
     Aquele nome caiu na minha cabeça como se fosse uma marreta. Os olhos escureceram e o ar quase me faltou. Eles tinham namorado antes de nos conhecermos, diziam que ela o havia trocado por mim. Aquilo, longe de ser uma segurança, era o andaime em falso pelo qual minha mente me conduzia. O cara era o maior ganhão da paróquia, e ainda podia ocorrer-lhe uma ideia de desforra. Em nenhum momento pensei na idoneidade da menina. Crápula que fui! Ser abjeto, cujos sentimentos afluíam de súbito sem medidas e sem pudor. Peguei rápido a bicicleta que estava mais à mão, sem sequer pedir licença ao dono, e desenfreei para a escola, que ficava a três ou quatro quilômetros dali. Na minha mente torpe, passava a cena dela, Cristiane, nos braços do outro, rindo e corroborando com o que ele dizia: “otário”. Os nervos abalados não me permitiam ver nada, pois a luz fosca que me assolara há alguns instantes já se tornava roxa, que é a cor do ciúme. Dobrei a penúltima quadra na frente de um ônibus, que freou bruscamente, dando-me tempo para desviar. Não dei por isso. Meu espírito de porco tinha maior preocupação do que ser apenas atropelado por um ônibus. Meus olhos adiantaram-se aos metros que restavam. Não vi ninguém. A frente do colégio estava às escuras, o bar da esquina, onde costumava ficar quando chegava mais cedo para minha tarefa diária, estava vazio. A luz roxa enegreceu-se de vez, meu coração já não batia, pulava tão acelerado que o barulho dentro do peito me impediu de ouvir alguém me chamando. Era ela. Sentada numa cadeira da casa de uma colega, em frente da escola, sorria o mesmo sorriso lindo de sempre. O mesmo sorriso meu, que ela me dera um dia quando me beijou a primeira vez.
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      Ela me disse que eu parecia um louco dobrando a esquina com aquela velocidade. E eu sabia disso, eu estava louco. Despediu-se da amiga e fomos para casa. Aos poucos com sua naturalidade habitual, me contou o que aconteceu, desde que faltara luz, o furdunço que se formou, a barulheira dos colegas, a ideia de ir para casa, o convite da colega para me esperar ali. Cada palavra era entrecortada por um breve sorriso. Era esse seu modo adolescente de falar. E cada sorriso eu tentava interromper com um beijo. A partir daquele dia descobri quão ruim, mal, crudelíssimo é o ciúme. Imaginem quantas pessoas já se destruíram e destruíram por culpa dele. Nunca mais tive ciúme. Aprendi a confiar nas pessoas, ou melhorei minha auto-estima.
     Quanto a Cristiane, um dia chegou-me e disse que estava apaixonada pelo primo, recém-chegado a Fortaleza e que iria casar com ele. Rolaram-me lágrimas durante três ou quatro meses, disse-me que nunca mais me enamoraria de outra garota, jurei ser volúvel, curtir, curtir e curtir, até que conheci... Não vou dizer quem, isso já é outra história.
(Professor Alves, 19/04/2011)

segunda-feira, 18 de abril de 2011

FÚRIA

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“O homem em fúria
tem a força de mil bois,
mas só realizará prodígios
com serenidade.”

       Há muito tempo, li esse trecho, que agora coloco em epígrafe, num desses livros de “cowboy” que lia amiúde. Abandonei a leitura desse gênero, mas a frase ficou. O sentido me foi logo compreendido, mas o que eu não sabia era que um dia iria presenciar a consecução final do seu enunciado.
    Era sábado, meu amigo e eu estávamos entrando no supermercado, digo, adentrando o estacionamento. Havia um bom número de carros esperando uma vaga. Meu amigo tamborilava no volante, estava tranquilo, pois sempre o fora assim. Nunca eu o vira descontrolado. Estava sempre calmo como as águas mansas de um riacho, cujo som que se houve são das pedrinhas por onde elas  passam. Baixou a mão para aumentar o som do carro, talvez porque ouvira uma notícia que o interessara. Alguém buzinou atrás de nós. À frente um motorista manobrava o carro em direção a uma vaga que acabara de surgir. A próxima seria nossa. Nisso o carro atrás de nós buzinou novamente. Meu amigo baixou o vidro um pouco para fazer ver ao motorista que havia espaço para que ele passasse. Nova buzinada, desta feita mais retumbante, quase um “sai do mei palhaço”. Meu amigo girou a direção para a direita, para colocar o carro mais um pouco ali para dar mais espaço para o outro passar. Mesmo assim o outro não passou, apenas se moveu. Mais à frente um carro começou a deixar livre uma vaga. Nossa vaga. Foi aí que vimos a verdadeira intenção do apressadinho que estava atrás de nós. Meu amigo ficou lívido e deu duas buzinadas para que o moço ou a moça visse que aquela vaga era nossa por direito. É um código de ética surdo que há entre todos os frequentadores de supermercado, mas infelizmente há sempre algum engraçadinho que tenta burlá-lo. Enquanto o carro mais à frente deixava a vaga o apressadinho que antes estivera atrás de nós, já manobrava na direção dela. Meu amigo passou a buzinar incessantemente como louco e se dirigiu com o carro mais para a frente. Vi que a lividez foi embora dando lugar a ira. Como um furacão que se forma nas águas tranquilas do oceano Pacífico, via uma tempestade de fúria se formar naquele semblante antes tão calmo. Com efeito, o motorista que ocupava o carro entrou na vaga que por direito era nossa. Nesse momento abriu-se uma outra vaga, mas meu amigo estava decidido a tomar satisfação com o penetra à nossa frente. Furioso, desceu do carro e se dirigiu aos motorista infrator. Este ao vê-lo e percebendo o perigo iminente, dirigiu a mão ao porta-luvas e retirou uma arma, era uma dessas pistolas de repetição tão em voga na mão dos bandidos. Fiquei atônito diante do movimento, curiosos já viravam seus rostos e alguns outros já se escondiam ante a iminência do tiroteio. Foi tudo muito rápido, mas essa rapidez durou uma eternidade para mim. O homem ergueu a arma para meu amigo que com uma habilidade totalmente desconhecida, talvez até por ele, tomou a arma do homem que ficou estático e como única defesa levantou os braços. Ouvi uma sequência de incontáveis disparos. Um segurança do supermercado correu e abraçou-se ao meu amigo que continuava a pressionar o gatilho da arma, já totalmente vazia. O homem continuava em pé com as mãos para cima, estático, paralisado. Fui até meu amigo e o conduzi para o carro, e nos afastamos do local. A arma ficou jogada no chão.
     Não houve uma desgraça. Pelo menos ali, mas sabemos que a todo instante pessoas armadas, deixando-se levar pela fúria, cometem assassinatos que destruirão suas vidas. Não foi assim no caso do Juiz Percy Barbosa, que num acesso de fúria inexplicada matou o vigia José Renato Coelho? Afastamo-nos do supermercado e fomos a um barzinho, onde tomamos em silêncio uma cerveja e meia, até que meu amigo abriu os lábios pela primeira vez para dizer “cara palhaço, rapaz!”. Deu um meio sorriso, levantou os braços para o céu, num agradecimento surdo, e nunca mais tocamos no assunto.
 (Professor Alves, baseado em fatos reais, 18 abril de 2011)

sexta-feira, 15 de abril de 2011

UM AMIGO ESPECIAL

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Algumas vezes na vida
Você acha um amigo especial
Alguém que muda a sua vida
Apenas por fazer parte dela
Alguém que faça você rir
Até não poder mais
Alguém que faça você acreditar
Que realmente existe o bem no mundo
Alguém que te convença de que realmente existe uma porta destrancada
Apenas esperando que a abramos
Esta é uma Amizade Eterna
Quando você está para baixo
E o mundo parece escuro e vazio
Seu Amigo Eterno levanta o seu astral
E faz daquele mundo escuro e vazio
Parecer de repente cheio e brilhante
Seu Amigo Eterno enfrenta
Os tempos duros, tristes
Se você resolve retornar
Seu Amigo Eterno te segue
Se você perder o seu caminho
Seu Amigo Eterno te guia
E te alegra.
Seu Amigo Eterno segura a sua mão
E diz que
Tudo vai ficar bem
Se você achar este tipo de amigo
Você se sente feliz e completo
Porque você não precisa se preocupar
Você tem um Amigo Eterno na Vida
E o Eterno não tem FIM!


Scrap enviado pela amiga Rosimeire Maciel

terça-feira, 12 de abril de 2011

A PRINCÍPIO OU A FELICIDADE REALISTA


         De norte a sul, de leste a oeste, todo mundo quer ser feliz. Não é tarefa das mais fáceis. A princípio, bastaria ter saúde, dinheiro e amor, o que já é um pacote louvável, mas nossos desejos são ainda mais complexos.
      Não basta que a gente esteja sem febre: queremos, além de saúde, ser macérrimos, sarados, irresistíveis.
       Dinheiro? Não basta termos para pagar o aluguel, a comida e o cinema: queremos a piscina olímpica, a bolsa Louis Vitton e uma temporada num “spa” cinco estrelas.
E quanto ao amor? Ah, o amor... não basta termos alguém com quem podemos conversar, dividir uma pizza e fazer sexo de vez em quando. Isso é pensar pequeno: queremos AMOR, todinho maiúsculo. Queremos estar visceralmente apaixonados, queremos ser surpreendidos por declarações e presentes inesperados, queremos jantar à luz de velas de segunda a domingo, queremos sexo selvagem e diário, queremos ser felizes assim e não de outro jeito.
       É o que dá ver tanta televisão. Simplesmente esquecemos de tentar ser felizes de uma forma mais realista. Por que só podemos ser felizes formando um par e não como pares? Ter um parceiro constante não é sinônimo de felicidade, a não ser que seja a felicidade de estar correspondendo a expectativas da sociedade, mas isso é outro assunto. Você pode ser feliz solteiro, feliz com uns romances ocasionais, feliz com parceiros, feliz sem nenhum. Não existe amor minúsculo, principalmente quando se trata de amor-próprio.

       Dinheiro é uma benção. Quem tem, precisa aproveitá-lo, gastá-lo, usufruí-lo. Não perder tempo juntando, juntando, juntando. Apenas o suficiente para se sentir seguro, mas não aprisionado. E se a gente tem pouco, é com este pouco que vai tentar segurar a onda, buscando coisas que saiam de graça, como um pouco de humor, um pouco de fé e um pouco de criatividade.
        Ser feliz de uma forma realista é fazer o possível e aceitar o improvável. Fazer exercícios sem almejar passarelas, trabalhar sem almejar o estrelato, amar sem almejar o eterno. Olhe para o relógio: hora de acordar. É importante pensar-se ao extremo, buscar lá dentro o que nos mobiliza, instiga e conduz, mas sem exigir-se desumanamente. A vida não é um game onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio. Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade. Se a meta está alta demais, reduza-a. Se você não está de acordo com as regras, demita-se. Invente seu próprio jogo.

MARTHA MEDEIROS, enviado pela amiga Mírian Semeraro

VELHA HISTÓRIA

        Li este texto uma vez, faz muito tempo. E por ele me apaixonei. Já era apaixonado por Mário Quintana. Depois passei a utilizá-lo em minhas aulas. Sempre contando a história, nunca a lendo. Meus alunos e alunas também se apaixonam por ela quando a ouvem. Certa vez uma aluna me confidenciou que encontrara a versão original, mas que gostara mais da minha versão, que não altera o texto original, muda apenas algumas palavras e/ou frases. Um aluno me encontrou certa vez no "shopping" e me pediu para eu colocar esse texto em meu blog. Para atendê-lo, teclei-o abaixo, do modo como sempre o profiro em sala. Que Mário me perdoe a pretensão

Mário Quintana, Poeta de Alegrete

        Era uma vez um homem que estava pescando, até que pescou um peixinho. Mas o peixinho era tão pequenininho, tinha um azulado tão indescritível nas escamas e um ar de inocência deveras aparente, que o homem morreu de pena. Tirou o anzol da garganta do coitadinho, untou-a com iodo e o colocou no bolso traseiro da calça para que o animalzinho sarasse no quente. 
         Desde então os dois tornaram-se amigos inseparáveis. Aonde o homem ia o peixinho ia atrás, a trote, igual a um cãozinho. Pelas praças, avenidas, elevadores. Era tocante vê-los, por exemplo, em um café.  O homem, vestido de preto, com uma das mãos segurava a xícara de fumegante moca, com  a outra lia o jornal, com  a outra fumava e com a outra cuidava do amiguinho, que, ao seu lado, tomava laranjada, por um canudinho feito especialmente para ele.
       Ora, deu-se que um dia os dois passeavam às margens do rio onde peixinho houvera sido pescado. De repente, o homem, adquirindo um ar mais grave do que de costume, disse para o peixinho:
         - Não, meu amiguinho, não me assiste mais o direito de tê-lo por mais tempo comigo. Tirá-lo do convívio de seu pai, de sua mãe, de seus irmãozinhos e irmãzinhas, de sua tia solteirona. Não e não! Desde já, volte para o seio de sua família e me deixe cá no mundo só e triste.
         Dizendo isso, o homem verteu copioso pranto, virou o rosto de banda e atirou o peixinho na água, e a água fez-se num terrível redemoinho, que foi serenando, serenando até que o peixinho morreu afogado. 

(Mário Quintana)

JOÃO E MARIA - IRMÃOS GRIMM

  E m frente a uma grande floresta morava um pobre lenhador com a mulher e dois filhinhos: João e Maria.   Tinham pouco com que se alimentar...