Acho que essa é a pergunta que o país inteiro se faz desde quinta-feira, às oito e trinta da manhã. Aos poucos sua máscara vai caindo, e por trás vislumbramos um monstro, como muitos já pensariam. Principalmente devido à frieza com que praticou sua chacina. Digo “sua” porque, infelizmente, virão outras, caso não se tomem uma série de medidas Brasil afora, e as autoridades sabem muito bem quais são. Trata-se de um indivíduo atormentado pelas dúvidas diante das quais o mundo o pôs. Apesar do grande sofrimento que se abateu sobre o país, não vejo nos rostos nenhum esgar de mágoa contra Wellington. O que vemos é a população séria, compungida, com lágrimas nos olhos, inclusive da presidenta (a quem começo a admirar pela ausência do populismo). São pessoas que se solidarizam e mentalmente enviam abraços, pêsames às famílias de fato enlutadas. Como se tivessem certeza da miséria humana cada vez mais em evidência. Miséria causada pela ausência dos valores essenciais. Mas quem é Wellington Menezes de Oliveira? Acho que a pergunta deveria ser outra: Quem são e quem serão os wellingtons da vida?
Na minha infância conheci um garoto cuja atitude recatada em excesso nos chamava a atenção. Todas as tarde, quando estávamos no campinho, ele aparecia por lá. Pouco conversava. Geralmente por monossílabos. Não jogava conosco, limitava-se a rabiscar o chão com um graveto ou ficar encostado num poste batendo o calcanhar. Diferente dos irmãos, alegres bem dispostos. Não tinha nenhum retardamento mental. Num dia desses, comuns, simplesmente se matou. Na ausência dos familiares, trespassou uma corda pelo caibro e se enforcou.
Morava perto de nossa casa um homem que criava uma macaca, dessas tipo macaco prego. Com ela fazia apresentações, e com ela ganhava a vida. Chamavam-no “véi da macaca” ou “gigolô da macaca”. Ele não gostava, por isso evitava estar onde havia pessoas. Preferia a companhia do animal. Certa vez um grupo de crianças resolveram achincalhá-lo. Era domingo de missa, Domingo de Ramos. Ele chegou ao limite, pegou uma tranca e investiu contra os garotos, atingindo um deles com certa violência. Por pouco não o matou, o menino passou dias em coma. O velho foi preso. Quando solto, foi embora, e nunca mais ouvimos falar dele.
Na escola em que trabalho, há uma garotinha que não fala com ninguém, não tem amizades, e não responde quando instigada a participar da aula. Comunicado o fato ao NAPE (Núcleo de Apoio Pedagógico Especializado), o pessoal diz que não tem nada a ver com o caso. Como ela, pela escola há uma legião de pessoas tristes, desolados, infelizes, que, por motivo desconhecido, se sentem como se não fizessem parte da sociedade, como se não fossem pessoas iguais às outras. Ainda na mesma escola há um garoto que pouco fala e, nos intervalos, se esconde em algum lugar com a bíblia nas mãos, que lê interminavelmente. Ano passado foi reprovado por falta.
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Com certeza, nossos leitores têm uma centena de casos semelhantes para contar. Gostaria de conhecê-los para futuras postagens. Todas essas histórias não são de fato levadas em conta pela população, nem pelas autoridades. Eles e elas são os wellingtons da vida, são aqueles que um dia tentarão se vigar da sociedade que os excluiu por falta de motivos. Seu filho assim como o meu sempre chega em casa relatando um caso de discriminação dentro da escola: é um “gordinho”, uma menina fora de faixa, outro que usa óculos fundo-se-garrafa, uma magricela, um “doidim” e por aí vai. Digamos sempre “filho isso não se faz, o que não queremos para nós também não devemos querer para os outros”. Se a sociedade não se mobilizar para acabar de vez com essa praga da arenga (bulling) e com o desprezo para com outras pessoas diferentes, que fogem ao paradigma, teremos muitos wellingtons por aí, atirando, para se vingar de um passado de tristeza e humilhação. Já ouvi alguém dizer “é culpa da televisão, é importação do que acontece nos Estados Unidos”. A culpa é nossa que fomentamos uma sociedade preconceituosa e que valoriza o ter em detrimento do ser. Quanto ao fato de copiarmos, é bom lembrar que somos mímese, somos cópia e não essência. Por isso temos o hábito da cópia. Mas é bom lembrar que copiamos o que está diante de nós. Coisas boas e coisas ruins. É preciso que vejamos as coisas boas, os bons exemplos, caso contrário só copiaremos o monstro e não o belo.
Um comentário:
Gostei do texto,vi uns aspectos da minha vida nele...
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